Coluna Vitor Vogas
Tribunal de Contas pode adiar municipalização de escolas no ES
Corte confirma: fechamento de escolas é possível, mas não foi recomendada pelo TCES e dependerá das decisões do Estado e dos municípios envolvidos

Sessão plenária do Tribunal de Contas do Estado. Foto: TCES
Se é para o bem de muitos e para a felicidade geral de uma nação de prefeitos, o Tribunal de Contas do Estado (TCES) pode ceder e adiar o início da implementação do Termo de Ajustamento de Gestão da Educação no Espírito Santo. Como demonstrado aqui, o “TAG da Educação” tem sido motivo de crescente polêmica e apreensão entre muitos governantes municipais, espalhados por todo o Estado.
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Assinado por 61 prefeitos, representando quase 80% dos 78 municípios capixabas, o TAG da Educação é um acordo proposto pelo TCES que tem peso de exigência legal, ou seja, precisa ser cumprido após a assinatura.
Relatado pelo conselheiro Rodrigo Coelho, o termo estabelece um profundo plano de reorganização do sistema público educacional do Espírito Santo, incluindo a rede estadual e as redes municipais das prefeituras que aderiram, visando a uma maior racionalização da distribuição das matrículas, dos recursos e da força de trabalho.
A primeira fase, que tem tirado o sono de prefeitos, prevê a municipalização de toda a oferta dos anos iniciais do ensino fundamental (do 1º ao 5º ano, antigo “primário”).
O cerne das preocupações é o prazo, que já está aí, batendo à porta: já no início do próximo ano letivo, em fevereiro de 2024, os 61 municípios signatários do acordo devem assumir e ofertar todas as turmas dessas cinco séries iniciais; assim, do 1º ao 5º ano do fundamental, o que for da rede estadual deverá ser municipalizado.
Estamos falando de um total de 7.072 matrículas, hoje ofertadas na rede estadual nos municípios que assinaram o TAG, que terão de ser absorvidas por esses municípios a partir de fevereiro.
Mas talvez não tão rapidamente.
Diante dos apelos de pelo menos 24 prefeitos, o TCES está disposto a avaliar pedidos de adiamento. Em nota oficial enviada à coluna, o tribunal informou que considera prorrogar o prazo para implementação da fase I do TAG, inicialmente prevista para fevereiro de 2024, devido às “dificuldades apontadas pelos municípios”.
A dilatação do prazo daria às prefeituras mais tempo para adequarem as respectivas redes de ensino a fim de darem conta de absorver o esperado aumento da demanda, isto é, o maior número de matrículas resultante do processo de municipalização. A possível prorrogação será decidida em votação no plenário do TCES – ainda sem data marcada.
O TAG começou a ser assinado no dia 15 de junho, em solenidade realizada na sede do TCES. Na ocasião, 51 prefeitos o firmaram. Depois, outros dez aderiram. Foi então que, aprofundando os estudos – ou compreendendo tardiamente a extensão do compromisso que assumiram –, muitos deles começaram a bater à porta do TCES para reclamar dos termos do acordo e buscar renegociá-los.
O TCES, então, abriu um prazo, encerrado no dia 30 de setembro, para que os interessados pudessem se manifestar oficialmente ao tribunal, relatando dificuldades relativas ao cumprimento do TAG.
A coluna apurou que 24 deles o fizeram – o equivalente a 40% dos signatários. A partir daí, no decorrer de outubro, esses 24 que “ergueram a mão” tiveram audiência coletiva com o relator, Rodrigo Coelho, além de reuniões com o TCES, o Ministério Público de Contas e a Secretaria de Estado da Educação (Sedu).
À Sedu, cada um dos 24 municípios precisou apresentar uma proposta de adequação e de aplicação do TAG, sugerindo algumas adaptações de acordo com a própria realidade e condições de cumprimento das exigências. Os representantes da Sedu analisaram cada um dos planos, finalizados em conjunto por Estado e municípios.
Com base em nossa apuração, podemos afirmar que, em alguns casos, ficou de fato comprovada a absoluta impossibilidade de início da implementação no ano que vem. No caso desses municípios, a Sedu concordou em estender o prazo para a municipalização dos anos iniciais do fundamental. Se o TCES concordar, o processo não será iniciado em fevereiro em tais cidades.
Os 24 planos foram, então, submetidos ao TCES, e agora estão em fase de análise no tribunal. A dúvida remanescente é se o tribunal decidirá prorrogar o prazo para os 61 signatários do TAG, para os 24 que manifestaram dificuldades até 30 de setembro ou somente, de forma específica, para aqueles dentre esses 24 que comprovadamente necessitam de mais tempo – avaliando, assim, caso a caso.
Em nota oficial, a Sedu informou que “visa garantir o cumprimento das adequações necessárias dentro do prazo, em acordo com os municípios. Toda adequação de cronograma que for necessária terá que ter como foco a garantia da qualidade no ensino-aprendizagem dos alunos”.
O risco de “fechamento de escolas”: segundo o TCES, isso pode de fato ocorrer
As respostas oficiais do TCES – reproduzidas na íntegra abaixo – também contêm alguns esclarecimentos primordiais não só para os gestores municipais, mas para toda a comunidade escolar das 61 cidades afetadas, aí incluídos alunos, pais, professores, diretores e outros profissionais da educação.
Uma preocupação enorme relativa ao TAG diz respeito ao possível “fechamento de escolas”. Sobre esse ponto, o TCES confirma que, sim, “poderá haver eventuais fechamentos de unidades escolares”, “em decorrência do processo de planejamento conjunto para a oferta de vagas”.
A Corte esclarece, no entanto, que (I) “o TCES não determinou ou recomendou o fechamento de nenhuma unidade escolar”; (II) no processo de municipalização, isso poderá ocorrer a critério dos gestores envolvidos; (III) “o fechamento de escolas é um procedimento regulamentado pelos Conselhos de Educação e deve seguir o disposto no normativo específico”.
Outra extrema preocupação se refere ao eventual fechamento de escolas campesinas, rurais, indígenas e quilombolas. O TCES esclarece que ficaram de fora do TAG as escolas localizadas em assentamentos organizados e assistidos pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
Quanto às demais escolas do campo, uma cláusula do acordo proíbe a “nucleação” (junção) de tais unidades escolares com unidades da cidade. Outra cláusula determina que o Conselho de Educação competente deverá regulamentar “a distância máxima de deslocamento do aluno até a escola”.
O TAG da Educação também prevê uma segunda fase, referente aos anos finais do ensino fundamental (do 5º ao 9º ano, antigo “ginásio”). Nessa etapa, para acabar com a “concorrência” entre a rede estadual e as municipais, a oferta, em cada município, terá de ser assumida ou integralmente pelo Estado ou inteiramente pelo município.
Para tanto, a Sedu e os 61 municípios signatários do TAG terão de dialogar e chegar a um entendimento entre si, para apresentarem ao TCES um plano de ação a partir da decisão conjunta tomada em cada município. O prazo para isso vai até 31 de dezembro de 2024.
Confira abaixo as respostas completas do TCES aos nossos questionamentos:
No que concerne à absorção da demanda do ensino fundamental, o que o TAG estabelece para os municípios signatários?
O TAG prevê, em sua Cláusula 2ª, o fim da concorrência na oferta do Ensino Fundamental em duas etapas. Em um primeiro momento, determina que os Anos Iniciais (1º ao 5º ano) sejam municipalizados quando ofertados pela Rede Estadual para o ano letivo de 2024. Para os Anos Finais (6º ao 9º ano), deverá ser decidido em conjunto se a oferta será realizada em sua integralidade pela Rede Municipal ou Estadual dentro do território. O município e o Estado deverão encaminhar sua forma de realização ao TCES até 31/12/2024, por meio de Plano de Ação. Portanto, a municipalização prevista expressamente no TAG é somente em relação aos anos iniciais do Ensino Fundamental (1º ao 5º ano).
Quantos e quais municípios assinaram o TAG?
O TAG foi assinado por 61 municípios. Não assinaram os seguintes municípios:
. Água Doce do Norte
. Alfredo Chaves
. Alto Rio Novo
. Conceição da Barra
. Ecoporanga
. Guarapari
. Iúna
. Irupi
. Jerônimo Monteiro
. Pinheiros
. Ponto Belo
. Presidente Kennedy
. Santa Maria de Jetibá
. São Gabriel da Palha
. São Mateus
. Serra
. Vila Velha
O TAG alcança escolas campesinas, rurais, indígenas e quilombolas, ou estas ficaram de fora?
Segundo o Acórdão 198/2023, excetuam-se do TAG as escolas localizadas em assentamentos organizados e assistidos pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, conforme Cláusula 3.6 do Termo de Ajuste. Em relação às demais escolas do campo, a Cláusula 3.5 veda a nucleação de unidades escolares do campo com unidades da cidade e a Cláusula 3.4 determina que o Conselho de Educação competente regulamente sobre a distância máxima de deslocamento do aluno até a escola.
Muitos prefeitos signatários têm expressado grande preocupação com o possível fechamento de escolas de ensino fundamental da rede estadual nos respectivos municípios. Com a transferência de parte da demanda para os municípios, isso pode de fato ocorrer?
Em decorrência do processo de planejamento conjunto para a oferta de vagas, poderá haver eventuais fechamentos de unidades escolares. No entanto, o fechamento de escolas é um procedimento regulamentado pelos Conselhos de Educação e deve seguir o disposto no normativo específico. No caso da municipalização de uma escola da rede estadual, não necessariamente a unidade escolar será fechada, podendo ocorrer, a critério dos gestores envolvidos, a municipalização também do prédio e não apenas a transferência de matrículas ao município. É necessário esclarecer que o Tribunal de Contas não determinou ou recomendou o fechamento de nenhuma unidade escolar. Eventuais decisões tomadas nesse sentido são de caráter discricionário do gestor e poderão ser objeto de ação fiscalizatória, tendo em vista a necessidade de observação de procedimentos específicos, conforme normatizado pelos Conselhos de Educação.
Com base no número de signatários, o TCES tem uma estimativa da quantidade de alunos que devem passar, em 2024, da rede estadual para as redes municipais de educação?
Como foram apontadas dificuldades pelos municípios para cumprimento da Cláusula 2.1 no início do ano letivo de 2024, o Plenário do Tribunal de Contas decidirá a respeito de possível prorrogação deste prazo.
Na rede pública, o Espírito Santo possui atualmente 17.308 matrículas nos anos iniciais do ensino fundamental, das quais 7.072 são ofertadas na rede estadual nos municípios que assinaram o TAG.
Importante destacar que o Termo de Ajuste de Gestão (TAG) foi de adesão voluntária pelos municípios e pelo Governo do Estado. O referido TAG tem o objetivo de melhorar a educação pública capixaba a partir de um melhor aproveitamento de matrículas, conforme detalhado em seu texto. Passado o momento da assinatura pelos Municípios, o Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo consultou aqueles que haviam assinado o referido termo se teriam efetivas condições de cumprir o que fora acordado.
As dificuldades apontadas pelos municípios foram encaminhadas à Área Técnica, ao Ministério Público de Contas e ao Relator do Processo, e aguarda-se a inclusão em pauta do Plenário para que sejam resolvidas as questões pendentes e realizadas eventuais alterações nas minutas que, ressalta-se, ainda não foram assinadas pelo Governo do Estado.
Por fim, dado o caráter consensual do TAG, nada impede que o Município que tenha alguma nova dificuldade a comunique ao TCES.
