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Coluna Vitor Vogas

Sistema prisional: ES terá mais presídios e mais câmeras corporais

Secretário estadual de Justiça revela o tamanho da superlotação atual da sistema penitenciário do Estado e o que o governo Casagrande está fazendo para diminuir o deficit de vagas e destravar essa bomba-relógio

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Rafael Pacheco, secretário de Estado da Justiça

Três detentos, em média, num espaço projetado para dois. Simplificando os números da equação, essa é a realidade atual do sistema penitenciário do Espírito Santo. Uma realidade que obviamente preocupa, reforçando aquela imagem do sistema como uma bomba-relógio que, a qualquer momento, pode explodir. Hoje, apesar da superlotação, a situação está sob controle, segundo o chefe da Secretaria de Estado da Justiça (Sejus), o policial federal Rafael Pacheco. Mas, como também admite o próprio secretário – ecoando, sem querer, o slogan da Rádio Band News –, “em cinco minutos, tudo pode mudar”.

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Também foi Pacheco quem informou os números precisos com que opera atualmente o sistema prisional estadual, em entrevista concedida ontem ao telejornal EStúdio 360. No momento, somando todas as unidades prisionais do Estado, existem 15,8 mil vagas disponíveis, mas o número de internos chega a, aproximadamente, 24 mil. Portanto, existe um excedente de massa carcerária de cerca de 8,2 mil homens e mulheres.

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Em outras palavras, o sistema opera 52% acima da sua capacidade; a relação de presos no sistema por vagas disponíveis é de 152%, ou de três internos para cada duas vagas existentes, conforme sintetizamos no início deste texto.

Presos demais para vagas de menos. O problema é de ordem matemática e física: três corpos não podem ocupar um espaço onde só caberiam dois. Como resolvê-lo?

A conta é uma divisão simples, cujos termos são os seguintes:

 

O objetivo é que esse quociente na verdade seja igual a, no máximo, 1 (100%). Para alterar o resultado da equação, é preciso mexer nos seus termos.

Por um lado, o Estado pode atuar em uma das pontas (o divisor da divisão), aumentando o número de vagas. Para tanto, não existe outra maneira: é preciso construir mais presídios, a fim de expandir a capacidade do sistema.

Por outro lado, as autoridades envolvidas também podem atuar na outra ponta (o dividendo da divisão), reduzindo o número de detentos. O quê?!? Reduzindo o número de detentos? Sim, isso mesmo: reduzindo o número de detentos. Prendendo melhor, em vez de prender mais. Mas como fazê-lo?

Em primeiro lugar, mantendo um olhar mais criterioso na porta de entrada do sistema. Vale dizer: qualificando as prisões, mandando para trás das grades quem realmente precisa estar preso, isto é, quem comprovadamente precisa ser isolado do convívio social por representar ameaça real à sociedade. Aqui a responsabilidade nem é tanto do Poder Executivo. Compete, primordialmente, ao Poder Judiciário, que pode e deve promover essa triagem mais seletiva por meio das audiências de custódia e da aplicação de medidas alternativas a quem comete delitos de menor poder ofensivo.

Em segundo lugar, é preciso manter um olhar ainda mais apurado na porta de saída, promovendo condições reais de ressocialização aos egressos do sistema e assim reduzindo as taxas de reincidência. Um preso que vira trabalhador ajuda a desinchar e a distensionar o sistema. Já um preso que reincide no crime e retorna à cadeia ainda mais perigoso só ajuda a inflar (e inflamar) ainda mais o mesmo sistema que o expeliu e que fracassou em seu dever de o devolver melhor à sociedade. “Precisamos calibrar a entrada e a saída do sistema”, condensa o secretário de Justiça.

As formulações acima são minhas, mas é mais ou menos o que defende o secretário de Estado da Justiça, e é em seus argumentos que me pauto. Rafael Pacheco preconiza justamente uma ação simultânea do Estado nessas duas pontas (ampliar as vagas no sistema e, se não for possível reduzir o número de presos, no mínimo mantê-lo no atual patamar), a fim de que, em alguns anos, o Espírito Santo consiga equalizar os números. Pacheco acredita que, assim, será possível, se não zerar o deficit atual, minimizá-lo na medida do possível, aproximando ao máximo as duas pontas (os dois termos da divisão).

Para isso, concretamente, o que está fazendo o Governo do Estado?

Os novos presídios previstos

“É óbvio que o Estado tem que ser melhor do que a mera construção de unidades prisionais. A gente tem que construir escolas, hospitais, e fechar penitenciárias. Mas ainda é uma realidade. Ainda precisamos construir presídios.”

Admitindo que esse quadro ideal ainda está no plano da utopia, o secretário revela que a Sejus no momento trabalha simultaneamente em três frentes visando à expansão do sistema, as quais, somadas, podem resultar na construção de até mais seis unidades prisionais nos próximos anos. A primeira dessas frentes já é segura; as outras duas, ainda não.

A primeira frente consiste na construção de mais dois presídios estaduais, sendo um em Cachoeiro de Itapemirim e o outro em Linhares. Segundo Pacheco, os dois fazem parte de um projeto do Governo do Estado aprovado junto ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), o qual prevê um financiamento de US$ 105 milhões para a Sejus – o equivalente, no câmbio de hoje, a mais de R$ 500 milhões.

As duas novas unidades devem começar a ser construídas no próximo ano, informa o secretário, e representarão mais 1,6 mil vagas no sistema, elevando o total para 17,4 mil. O empréstimo contratado junto ao BID ainda prevê uma série de estruturas voltadas à ressocialização dos presos, nas quais será investida a maior parte do dinheiro emprestado pelo banco. Isso já está certo e contratado. É uma questão de tempo.

Paralelamente, a Sejus trabalha com outras duas frentes alternativas, ainda em fase de avaliação, cada qual podendo resultar em mais um par de novos presídios.

Uma delas é a construção de mais duas unidades por meio de parcerias público-privadas (PPPs). Esse projeto, revela Pacheco, já foi apresentado pela Sejus à Vice-Governadoria. É lá, sob a batuta do vice-governador Ricardo Ferraço (MDB), que são analisadas e aprovadas ou não todas as possibilidades de PPPs a serem firmadas pelo governo com a iniciativa privada. O projeto já foi aprovado pelo núcleo de Ferraço, mas sua concretização ainda não é certa (até porque dependerá do interesse de eventuais parceiros).

A última alternativa, encomendada à Sejus pelo governador Renato Casagrande (PSB), é um projeto de construção de mais duas unidades prisionais com recursos próprios do Tesouro Estadual. Isso também ainda não está fechado.

No momento, a Sejus vai trabalhando em paralelo com essas duas possibilidades. É um “cardápio de opções”, como define o secretário. Não quer dizer que todas darão certo nem que o governo pretenda necessariamente construir mais seis unidades nos próximos anos. Mas, pelas contas de Pacheco, se o governo conseguir construir de três a quatro unidades, o deficit atual pode ser reduzido à metade, passando de 8,2 mil para cerca de 4 mil vagas, ou seja, aquela relação detentos/vagas, atualmente em 150% (1,5), poderá cair para 125% (1,25), numa perspectiva realista.

“Estamos levando adiante essas possibilidades, e as que se mostrarem promissoras a gente continua. Não podemos construir unidades prisionais sem um horizonte de controle do sistema. Mas acho que devemos perseguir a baixa do deficit de vagas. Se conseguirmos criar entre 3 mil e 4 mil vagas, reduziremos à metade o deficit atual. E é isso que estamos perseguindo”, afirma o secretário.

Pacheco não revela os municípios onde o governo estuda erguer os possíveis novos presídios, seja pelo modelo de PPP, seja com recursos próprios, para evitar a resistência prematura que esse tipo de proposta sempre gera entre a população e, principalmente, os gestores municipais – muitos deles prestes a entrar em uma campanha à reeleição. É aquela coisa: ninguém quer ter uma prisão no quintal de casa.

Secretário sobre câmeras corporais: “Quero adquirir centenas”

Em fevereiro do ano passado, a partir de uma portaria do governador, cerca de 70 policiais penais (ainda sem essa nomenclatura) passaram a usar câmeras corporais no dia a dia laboral de maneira experimental. Segundo Pacheco, o experimento foi um sucesso.

Hoje a Sejus tem em torno de 1,9 mil policiais penais efetivos em atuação. A meta estipulada por Pacheco é que, ao longo do tempo, todos sejam equipados com uso de câmera corporal em sua atividade diária. “A meta é adquirir para todos eles. Quero adquirir centenas.”

O secretário conta que, após certa resistência inicial, a câmera corporal caiu no gosto dos policiais penais, que hoje, em sua grande maioria, aprovam a ideia e defendem o uso do equipamento. “Eu sou policial. Eu usaria com facilidade. A complexidade não é mais quanto à utilização dos equipamentos. Isso a gente superou. Os policiais penais querem usar”, assegura o secretário.

A dificuldade presente, segundo ele, tem muito mais a ver com a tecnologia a ser adquirida (que, para não ser “tabajara”, custa muito dinheiro).

“Minha ponderação é quanto à tecnologia adotada. É preciso que seja uma tecnologia que não permita que haja nenhuma interferência humana e que propicie zero responsabilidade do agente sobre o próprio equipamento. Ele tem que chegar para o trabalho, pegar a câmera em determinado posto no início da jornada, levá-la no uniforme durante toda a jornada e guardá-la no mesmo posto no fim da jornada. Não pode ser nada além disso. Se um determinado juiz quiser saber o que ela câmera gravou no dia tal, vai solicitar a câmera na unidade e as imagens estarão ali. É assim que tem de funcionar.”

Concursos públicos: a contratação de policiais penais

Em dezembro do ano passado, a Assembleia Legislativa aprovou e Casagrande sancionou a lei que estruturou a Polícia Penal do Espírito Santo. Os policiais penais são os antigos inspetores penitenciários. Quando a lei foi sancionada, havia cerca de 1,9 mil inspetores efetivos (concursados do Estado) e aproximadamente a mesma quantidade de inspetores em designação temporária (os DTs).

Os efetivos foram automaticamente transformados em policiais penais. Já os DTs, pela lei, não podem virar policiais penais nem exercer atividades próprias dessa categoria. Paulatinamente, eles serão substituídos por novos policiais penais, a serem selecionados através de concurso público. O primeiro concurso já foi realizado, e cerca de 1 mil foram aprovados.

Segundo Pacheco, Casagrande já sinalizou com a intenção de convocar todos eles, de maneira fracionada (três turmas). A primeira turma, formada pelos primeiros 350 aprovados, já está em fase de exames médicos. As aulas teóricas, com dois meses e meio de duração, começarão em julho. Depois disso, os alunos já passarão ao estágio operacional, atuando diretamente nos presídios estaduais.

Enquanto isso, a partir de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) selado entre a Sejus e o Ministério Público Estadual, os DTs podem continuar trabalhando, mas estritamente em atividades socioeducativas. Só que a “sobrevida” deles não é longa. Serão exonerados gradativamente, à medida que os novos concursados forem sendo nomeados. Até 2027, todos os DTs deverão ter sido substituídos por policiais penais aprovados em concurso.


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