Coluna Vitor Vogas
Tyago Hoffmann: para o bem ou para o mal, a cara do governo Casagrande na Ales
As vantagens e desvantagens da associação automática que persiste entre o agora deputado estadual e o Palácio Anchieta nesse início de carreira política do ex-homem forte do governo. O que diz o próprio Tyago sobre sua inusitada posição, sobre os ressentimentos de colegas com ele e sobre o elefante no plenário: a alegação quase geral de que foi favorecido na eleição
Nesse seu início de caminhada como detentor de mandatos, Tyago Hoffmann (PSB) não terá vida fácil. Para o bem ou para o mal, o ex-secretário estadual de Governo está inextricavelmente associado ao governador Renato Casagrande (PSB) e à sua administração.
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No momento, o agora deputado estadual continua visto pelos demais como sinônimo de “Palácio Anchieta” e como a fisionomia do governo no plenário da Assembleia. Por mais que tenha completado a transição da pele de secretário de Estado para a de parlamentar, ele ainda é encarado pelos pares como o procurador do governo em trajes de deputado, ou pior: como um agente infiltrado entre eles.
Sendo assim, muitas das insatisfações e ressentimentos não só de opositores mas também de aliados do Palácio tendem a ser canalizados para Tyago. O agora vice-líder do governo – confirmado na função no último dia 16 – corre o risco de virar um para-raios da gestão Casagrande na Assembleia. Tentando atuar como escudeiro, tende a virar um alvo preferencial. Isso ficou cabalmente demonstrado já na primeira sessão para votação de projetos do Executivo, no último dia 15.
A sessão foi marcada por uma trombada frontal entre Fabrício Gandini (Cidadania) e Tyago. O vice-líder do governo alertou os colegas de que, se aprovado com uma emenda de Gandini, um projeto que prevê a criação de uma bolsa estudantil poderia ser vetado por Casagrande, deixando os alunos sem benefício algum. Nesse caso, advertiu Tyago, quem votasse dessa maneira teria de se responsabilizar pela frustração da bolsa para os potenciais beneficiários.
Gandini pegou a deixa para dizer que Tyago estava inaugurando a “política do medo” e do “terror” na Casa. Em conversa reservada com a coluna, outro governista “rebelado” classificou o alerta de Tyago como uma “agressão”.
Gandini e outros deputados da base (ou até então da base) já estavam descontentes com o governo por motivos que vão muito além da discussão em plenário, desde exonerações de aliados a desprestígio no novo mandato de Casagrande. O descontentamento acumulado confluiu para o “representante do governo em plenário”, e o recado para o Palácio foi passado através de Tyago.
O próprio deputado reconhece a situação sui generis em que se encontra, mas pondera:
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“Não é que eu seja o alvo. O governo é que é o alvo. Na Assembleia, o governo sempre está de alguma forma sendo avaliado. No caso da oposição, é muito natural que ela confronte e questione todas as ações do governo. No caso da base, é normal que haja alguns momentos de insatisfação e que nesses momentos aconteçam alguns episódios como esse da última sessão. O alvo ali não fui eu. Quiseram mandar um recado para o governo. Mas é claro que, para mandar recados para o governo, podem me ter como alvo. O fato é que, para o bem e para o mal, o governador e eu criamos uma relação muito próxima. Isso é muito positivo em alguns aspectos e muito negativo em outros.”
Sobre o peso e o “lado muito negativo” dessa proximidade para ele mesmo, o deputado me dá uma resposta ambivalente. Por um lado, afirma não se incomodar com essa associação instantânea que se faz entre ele e o governo Casagrande, mesmo que ele agora esteja investido de mandato próprio, e em outro Poder.
“Isso não me incomoda. Não tenho nenhuma vergonha do meu passado e do que eu construí. Cheguei aonde cheguei na gestão Casagrande pelos meus méritos. Não sou filho de político. Eu era um técnico, trabalhava no Instituto Futura e fui chamado pelo governador para trabalhar com ele no seu primeiro governo, inicialmente como subsecretário de Saúde, na área administrativa e financeira.”
“Não sou o Renato Casagrande”
Por outro lado, o próprio Tyago admite vir fazendo um esforço para atenuar essa associação imediata e passar a ser encarado pelos pares não como o procurador do governo em trajes parlamentares, mas como mais um dos 30 deputados, com autonomia no exercício do mandato e reconhecido por suas próprias ações.
Prova disso é um episódio que colegas dele já haviam me relatado e que ele mesmo confirma. No dia 31 de janeiro, véspera da eleição da Mesa Diretora, Marcelo Santos (Podemos) reuniu seus apoiadores no escritório de Mazinho dos Anjos (PSDB). Na ocasião, Tyago fez uma fala nesse sentido:
“Fui claro: o que quero que meus colegas enxerguem é que aqui não sou um representante do Executivo. Sou o Tyago, tenho a minha vida própria, minhas ideias, meus ideais e pensamentos. Mas isso é com o tempo. Os deputados não vão ganhar essa confiança em mim com uma ou duas semanas de trabalho. Da minha parte, não é uma preocupação. É um desejo de que as pessoas me enxerguem como eu mesmo. Não sou o Renato Casagrande. Sou o Tyago Hoffmann.”
O estreante em mandatos faz uma ressalva, porém: tentar desvencilhar-se um pouco dessa imagem de “homem do governo” não significa, de modo algum, afastar-se politicamente de Casagrande.
“No bom sentido da palavra, estou ‘condenado’ a essa lealdade, pois devo minha carreira profissional na vida pública ao governador. Se ele não fizer nada por mim daqui para a frente, minha lealdade a ele continuará a mesma do início.”
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O “favorito” em 2022
Há, todavia, um outro elefante na sala – ou melhor, postado bem no meio do plenário: entre deputados da base no mandato passado, não eleitos e inclusive reeleitos, é quase generalizada a alegação de que Tyago foi altamente favorecido pelo governo Casagrande e que, para eleger o ex-secretário, o Palácio não poupou o uso da máquina estadual, passando por cima inclusive de outros aliados em seus próprios redutos.
Exemplo prático do que seria esse “passar por cima”: cooptar cabos eleitorais de deputados com mandato nos respectivos municípios. Por esse ângulo, Tyago não seria agora apenas um anteparo entre colegas de plenário e o governo. Seria isso também. Mas há arestas não aparadas e ressentimentos indisfarçados cujo alvo não é outro senão ele mesmo; ressentimentos que remontam ao processo eleitoral e agora estão sendo extravasados.
Tyago nega ter tido privilégios. Para ele, realmente determinante em sua vitória foram o trabalho anterior à eleição – à frente da “Supersecretaria” de Ciência, Tecnologia, Inovação e Desenvolvimento (Sectides) – e seu próprio esforço durante a campanha.
“Não tive nenhum favorecimento. O que eu tive do governo foi uma ajuda no sentido de ter um espaço de trabalho: uma secretaria que até então não existia e que ninguém queria porque não era vista como propícia para alguém que quisesse se eleger. Se alguém dissesse que alguém poderia se eleger pela Secretaria de Ciência e Tecnologia e pela Secretaria de Desenvolvimento, diriam ‘muito pouco provável’, porque têm poucos instrumentos de trabalho político-eleitoral”, pontua o deputado.
“Não atropelei ninguém”
No primeiro governo Casagrande (2011-2014), após ser subsecretário de Saúde, ele foi secretário de Governo e chefe da Casa Civil. No segundo (2019-2022), começou como secretário de Governo e, no início de 2021, tornou-se chefe da Sectides, resultante da fusão de outras duas pastas. Ele prossegue em uma espécie de desabafo:
“Eu tinha certeza de que escutaria isso de outros deputados e de pessoas que não são da política: ‘Ah, o Tyago vai ficar de pernas pro ar, o governador vai dar meia-dúzia de telefonemas e ele estará eleito’. Estava preparado para ouvir isso. Mas eu sei o que me esforcei. Rodei mais de 40 mil quilômetros. Passei por algo entre 63 e 65 municípios. Em uma campanha, naturalmente, ocorre de alguém pegar um cabo eleitoral que poderia ser do outro, como também ocorreu comigo. Isso ocorre de lado a lado. Agora, ‘ressentimento’ é uma palavra forte. Não tenho isso de ninguém e não gostaria que tivessem de mim, porque não atropelei ninguém. Mas, se existe mesmo, as pessoas têm que trabalhar isso dentro delas, porque tenho isso muito bem trabalhado dentro de mim”, completa, em termos psicanalíticos.
Sobre alegações de truculência, Tyago também as afasta: “Com o tempo os colegas vão ver que sou uma pessoa conciliadora e do diálogo. Tenho diálogo com todos, da oposição e da base, e respeito por todos, como também quero que tenham por mim. Quero ser respeitado pelos colegas como deputado que sou. Não vou atacar nem agredir ninguém, a não ser que façam isso comigo”.
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Um recado do amigo do Rei
Para encerrar, nesta temporada de tantos recados em múltiplas direções, Tyago também trata de deixar mais um, endereçado a seus colegas de base:
“Se por um lado alguns podem me enxergar como um infiltrado, por outro alguns podem me enxergar como uma ponte e um facilitador na interlocução com o governo, pelo conhecimento que tenho das engrenagens da administração estadual. Não sou só eu que preciso de entregas. Muitos serão candidatos a prefeito em 2024.”
Pode ser traduzido assim: em vez de se ressentirem tanto dessa proximidade de Tyago com o governo, colegas da base deveriam é buscar se valer dessa proximidade e tirar o melhor proveito dela.
Ou assim:
Enquanto alguns dão bobeira tentando pintá-lo como um inimigo que ele mesmo não quer ser só porque ele é amigo do Rei, deveriam é buscar tê-lo como amigo (exatamente pelo mesmo motivo). Aos agora colegas de Parlamento, ele pode ser muito mais útil como amigo que como inimigo.
Afinal, um amigo do amigo do Rei é, também, um amigo do Rei.
Adendo: o alerta de Vandinho
Antes de passar a régua, quero lembrar que, ainda na sessão do dia 15, Vandinho Leite (PSDB) passou outro recado ao governo e ao próprio Tyago Hoffmann: o de que o plenário não vai aceitar eventual subida de Tyago para o posto de líder do governo.
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Vale lembrar que, na aludida sessão, o governo ainda não havia indicado oficialmente seu líder (Dary Pagung) e seu vice-líder (Tyago). Ambos já estavam atuando nas respectivas posições, se apresentaram assim e assim foram reconhecidos pelos demais. Mas Vandinho pareceu fazer questão de registrar a resistência dele e de outros ao substituto imediato de Dary (PSB). Logo após o entrevero de Tyago com Gandini, o tucano mandou esta da tribuna:
“E vou dizer aqui: se tem alguém que ameniza isso [crises na base] é o deputado Dary Pagung. Ele é bombeiro. Ele é educado. Ele dialoga com as pessoas. Tenta encontrar o caminho para todo mundo. Eu acho que tem que ser esse o perfil dos parlamentares que são da base e que querem colocar mais deputados na base. Ou talvez o objetivo seja jogar mais deputados na oposição, para ser melhor atendido. Pode ser uma estratégia. Vamos perceber no decorrer desse mandato.”
Coincidência ou não, logo no dia seguinte (16), Casagrande enfim mandou à Assembleia a mensagem oficializando a manutenção de Dary na liderança e designando Tyago para o cargo de vice-líder.
Entre as muitas arestas de Tyago, no caso específico de Vandinho, há o agravante de ele ter sido decisivo para a implosão da chapa do tucano e a vitória de Marcelo Santos na eleição da Mesa: quando Tyago pulou para o lado de Marcelo, indicou aos demais o caminho a ser seguido, depois confirmado por Casagrande. Tyago foi quem inaugurou a debandada e o início da virada de mesa.
Mas há mais que isso. Como dito acima, rancores de colegas com Tyago remontam aos tempos em que ele era o poderoso secretário de Governo na administração passada, atravessam as eleições de 2022 (muitos aliados se ressentem de a máquina do governo ter favorecido Tyago) e se reflete já nestas primeiras sessões plenárias.
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