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Coluna Vitor Vogas

Antigo Partido Comunista Brasileiro: afinal, o que virou o Cidadania no ES?

Marcos do Val, Da Vitória, Luiz Emanuel, agora Gandini… Nos últimos anos, políticos importantes passaram pelo partido de “centro-esquerda”, mas ou já eram ou se revelaram representantes da direita. O que o presidente nacional, Roberto Freire, comenta sobre isso? E, afinal, como ele descreve a sigla? Confira

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Da esquerda para a direita: Fabrício Gandini, Josias da Vitória, Luiz Emanuel Zouain e Marcos do Val

Do Val, Da Vitória, Luiz Emanuel, agora Gandini… Afinal, o que está acontecendo com o Cidadania e o que se tornou o partido, excepcionalmente, no Espírito Santo?

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Nos últimos anos, o antigo Partido Popular Socialista (PPS) tornou-se abrigo político ou incubadora de uma série de políticos que ou já eram de direita (e só entraram na legenda para disputar determinada eleição) ou, uma vez eleitos, descobriram-se ou revelaram-se como parlamentares de direita.

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O exemplo mais bem-acabado é o do senador Marcos do Val. O ex-instrutor de segurança, um anti-esquerdista férreo, filiou-se e elegeu-se senador pelo Cidadania em 2018, a convite de Gandini e Luciano Rezende e com as bênçãos e total apoio de Renato Casagrande (PSB). Já na campanha, porém, Do Val expressava um perfil de direita. Sua principal bandeira eleitoral foi a facilitação do acesso a armas de fogo por civis. E assim também tem sido em seu mandato até aqui.

A incompatibilidade com o ideário oficial do Cidadania era evidente. Tanto que, uma vez eleito, o senador permaneceu bem pouco no partido. Muito pouco à vontade, decidiu migrar para o Podemos em meados de 2019, com apenas alguns meses de mandato.

Pôde fazê-lo sem incorrer em nenhum risco, pois a legislação brasileira permite que detentores de mandatos majoritários, como prefeitos, governadores e senadores, troquem de sigla a qualquer tempo. No ano passado, Do Val apoiou a reeleição de Jair Bolsonaro (PL).

Também na eleição de 2018, o então deputado estadual Josias da Vitória recebeu igualmente a legenda do Cidadania e, pelo partido, elegeu-se para a Câmara Federal. No meio do mandato, o cabo da reserva da PMES me disse não ter nada a ver com a esquerda. Em 2022, trocou o Cidadania pelo Progressistas (PP), partido que fez parte da coligação de Bolsonaro. Da Vitória apoiou o então presidente e, pelo PP, reelegeu-se deputado federal.

Na última eleição municipal, em 2020, o Cidadania elegeu a maior bancada na Câmara de Vitória: três dos 15 vereadores. Surpreendentemente, os três são políticos de direita: Maurício Leite, Denninho Silva e Luiz Emanuel Zouain (este após passagens pelo PT e pelo PSDB). Tanto que, sem exceção, apoiaram Lorenzo Pazolini (Republicanos) contra João Coser (PT) no 2º turno da eleição para prefeito.

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No meio do mandato, Denninho recebeu autorização para sair do Cidadania, filiou-se ao direitista União Brasil e elegeu-se deputado estadual.

Já Luiz Emanuel, desde o início da atual legislatura na Câmara de Vitória em 2021, vem exercendo um mandato extremamente alinhado com pautas bolsonaristas. Foi outro que apoiou a reeleição do então presidente em outubro passado. No fim do ano, recebeu da direção estadual do Cidadania (leia-se Gandini) a anuência para sair do partido com a garantia de que não pediriam seu mandato na Justiça Eleitoral. E assim fez.

No momento, mais alinhado à esquerda mesmo no Cidadania, resta Vinicius Simões, que voltou à Câmara de Vitória no lugar de Denninho. À exceção do vereador, o Cidadania acabou como partido de centro-esquerda no Espírito Santo.

“Estão todos fora, né? Estão todos fora? Ótimo! Se eles tivessem ficado, aí é que seria ruim!” A afirmativa é do presidente nacional do Cidadania, o ex-deputado federal por São Paulo Roberto Freire, em resposta a uma pergunta minha, por telefone, sobre os nomes listados acima, muito mais identificados com a direita, e sobre o que se transformou o Cidadania no Espírito Santo nos últimos anos.

Afinal, Ok, “estão todos fora”: entraram no partido e, sem ambiente, saíram. Mas a questão impositiva então é outra: por que é que lhes abriram as portas, em primeiro lugar?

Como é que um partido com essa história, nascido do Partidão em 1992, declaradamente de centro-esquerda – como confirma Freire –, dispõe-se a filiar tantos políticos importante manifestamente de direita no Espírito Santo e se presta a servir de “mula” ou apenas como “veículo” para tais candidatos durante o processo eleitoral? Uma vez no mandato, eles “se descobrem no partido errado”…

“Uns demoram mais, uns demoram menos, mas estão saindo do Cidadania. O que está acontecendo aí no Espírito Santo não é algo negativo, pelo contrário”, argumenta Freire.

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O Cidadania, por Roberto Freire

O dirigente nacional posiciona o seu partido no atual espectro ideológico nacional: “É claro que o Cidadania continua sendo de centro-esquerda. Mas pode ter liberais que até se julguem mais de direita que de esquerda. Isso até pode ter”, concede Freire, 80 anos.

O ex-deputado também assina uma crítica apaixonada, dentro do campo progressista, ao presidente Lula e ao PT. Ele não poupa críticas ao atual governo, ao partido do presidente e a concepções econômicas defendidas a ferro e fogo por certa ala do PT, mais radical e arredia ao liberalismo econômico.

“O Cidadania representa um posicionamento para o futuro. Fazemos uma crítica à esquerda hegemonizada por Lula e pelo PT, que ainda é prisioneira do passado”, começa Freire, para logo depois explicar melhor:

“Eles ainda estão falando como se fossem prisioneiros do capitalismo, no chão de fábrica… Essa esquerda continua defendendo esqueletos antidemocráticos, como na Venezuela. Isso acabou! O mundo está mudando, e tem gente que fica presa a dogmas. Agora o mundo é outro! Ninguém vai resolver os problemas de hoje com sabedoria do passado”, filosofa.

Freire insiste quanto às aceleradas mudanças por que o mundo inteiro tem passado neste século, após o desmanche do bloco soviético e o fim da Guerra Fria:

“Alguém por acaso ainda acredita que faremos uma economia estatizada e centralizada? Isso ainda existe, mas não tem nenhum futuro. O mundo mudou, estamos numa nova era na humanidade. Embora nós tenhamos origem comunista – essa linha histórica existe –, o Cidadania é um partido aberto para o futuro”, formula.

Freire reconhece a derrota do modelo comunista na História lá na queda do Muro de Berlim, em 1989:

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“Não tem mais nenhum sentido alguém imaginar uma economia estatizada, planificada e tal. A História nos derrotou lá atrás. Então nós estamos abertos para os novos movimentos dessa nova sociedade. Não temos que ficar aqui como se fôssemos os ‘velhos comunistas’. Isso ficou perdido numa página da História. Acabou, ficou no passado, não vai voltar mais. Aquela ideia de que “a História se repete” [enquanto farsa, citando Karl Marx]… isso não existe!”

Freire critica o que ele classifica como “neoludismo”. O “ludismo” foi, no século XIX, no princípio da Revolução Industrial, um movimento de operários que se uniram e se revoltaram não contra os patrões, mas contra as próprias máquinas que operavam, então destruídas por eles.

“Essa esquerda tem uma parte reacionária! São os ‘neoludistas’, que não estão entendendo essa nova economia de hoje neste novo mundo digital. São os prisioneiros do ‘imperialismo yankee’ e da Guerra Fria”, dispara o presidente nacional do Cidadania (ex-PPS, por sua vez nascido do PCB), em crítica endereçada a partidos como PT, PCdoB e Psol.

“O Cidadania vem do comunismo, mas entendeu a derrota histórica do comunismo com a queda do Muro de Berlim. O Muro de Berlim caiu na nossa cabeça, e tem pessoas que acham que isso não aconteceu! Nós fomos derrotados. Ali isso ficou evidente”, arremata o dirigente.

Para constar: após mudar o nome para Cidadania em 2017, o PPS abandonou o socialismo democrático e os ideais anticapitalistas que lhe davam fundamento, iniciando a defesa do liberalismo econômico, apesar de ter mantido o caráter progressista, pelo menos em teoria.

Desde 2022, o Cidadania compõe uma federação partidária com o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB).


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