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Coluna Vitor Vogas

Eleição em Vitória: o que explica a mudança de tom do João nas redes?

Pré-candidato do PT à Prefeitura tem se mostrado um personagem bem diferente do habitual político afável conhecido há décadas pelo eleitorado capixaba

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Deputado João Coser (PT) no plenário da Assembleia. Foto: Lucas S. Costa/Ales

Não é nem tanto pela sucessão de críticas ao atual prefeito, Lorenzo Pazolini (Republicanos). Críticas são sempre válidas, se bem fundamentadas, e mais que naturais em um contexto de disputa eleitoral. O que tem chamado a atenção, mais até que as mensagens, é a mudança de tom e de linguagem por parte do deputado estadual João Coser (PT).

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Desde março, o pré-candidato a prefeito de Vitória tem mantido em suas redes sociais uma ofensiva quase diária contra Pazolini num tom muito mais incisivo do que lhe é habitual; um tom que gera certo estranhamento a todos que o conhecem minimamente e que estão muito mais acostumados com o personagem político afável em que Coser se constituiu ao longo de décadas, no poder ou na oposição, desde os anos 1980.

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Nas imagens e legendas dos posts, o deputado tem apelado reiteradamente para frases de efeito, impactantes, que por vezes parecem exageradas ou “um pouco acima do tom”, sempre, é claro, focando em Pazolini e em possíveis deficiências da administração do “delegado amarelão” (nas palavras do próprio Coser, para citarmos o primeiro exemplo do que estamos falando).

Grande espaço tem sido dado a questões ligadas à área da segurança pública, de fato um ponto sensível para o atual prefeito, não só por ele ser delegado, não só por ter dado muita atenção à área em sua triunfante campanha em 2020, mas porque o número de homicídios da Capital, de fato, cresceu de 2022 para 2023 (única cidade da Grande Vitória onde se observou uma alta).

Ontem (19), atendendo a pedido da Prefeitura de Vitória, um juiz mandou Coser tirar do ar um post feito na última segunda (15), na qual o petista, de fato, claramente passou do ponto, afirmando que “Vitória é a cidade que mais mata na Grande Vitória” (discurso “mundo cão” para dar uma informação estatisticamente equivocada, desmentida pelos dados oficiais). Horas antes da publicação, um teaser (um aperitivo): “Vitória hoje está sob a escuridão, o crime e a violência. Vamos mostrar tudo”. Na legenda: “Vitória hoje é a capital da INSEGURANÇA” (assim mesmo, tudo em letra maiúscula).

No dia seguinte, terça-feira (16), Coser recordou a “promessa eleitoreira” (palavras dele) de Pazolini em 2020 de que a segurança pública seria “tratada no gabinete do prefeito”. “[Você sabe] por que hoje a capital é disparada a cidade da Região Metropolitana que mais viu crescer o número de homicídios?”, questionou o petista, levantando a bola para ele mesmo responder: “É porque o prefeito delegado AMARELOU. Amarelou pra bandidagem, amarelou pro tráfico de drogas, amarelou pros assaltantes”.

Dias antes, também no Instagram, Coser botou na conta do atual prefeito problemas que, ok, podem até ser agravados por omissão ou ineficiência da Prefeitura em cobrar, fiscalizar etc., mas não são necessariamente “culpa” ou responsabilidade exclusiva do poder público municipal, como o falta de gás e explosão dos casos de dengue.

“Quatro bairros de Vitória ficaram sem o fornecimento de gás e o prefeito nem sequer se manifestou sobre o ocorrido. Como você explica sua falta de cobrança aos responsáveis, Pazolini?”; “De 887 para 10 mil casos de dengue. Este é o saldo da gestão do atual prefeito (primeiro lugar nesse ranking em que ninguém quer ser o campeão)”, publicou o deputado do PT, apontando “o sucateamento da saúde por parte da gestão Pazolini”.

Após plenária em Jucutuquara, o ex-prefeito afirmou que “os moradores [da região] estão esquecidos e jogados para escanteio pela atual gestão municipal”. De igual modo, sublinhou a “sensação de abandono” em Jardim da Penha.

Atenção: todos esses exemplos foram colhidos da timeline de João Coser só nos últimos dez dias.

Por que Coser está fazendo isso?!? Como explicar essa “nova persona política”?

A resposta passa diretamente pelo marqueteiro Fernando Carreiro, contratado por João Coser para começar a trabalhar para ele e produzir conteúdos já na fase de pré-campanha.

Aparentemente, Carreiro e os outros estrategistas da comunicação política de Coser concluíram que o antigo “João Paz e Amor”, vencedor das campanhas de 2004 e 2008, já não serve para enfrentar um adversário duro e com a máquina na mão como Lorenzo Pazolini.

Por essa ótica, não daria para enfrentar o “Delegado”, um político que cresce no confronto político desde os tempos de deputado estadual, com uma postura pacífica demais que pode se confundir com postura passiva.

Além disso, a estratégia lançada obedece a um objetivo pragmático, que pode ser assim resumido: se quiser alentar alguma esperança de vencer a “parte 2” do duelo contra Pazolini, Coser precisa, para ontem, começar a furar a própria bolha.

É preciso acenar desde já para outros segmentos da cidade e expandir o eleitorado em potencial do candidato do PT.

Os votos do eleitorado de esquerda de Vitória, Coser naturalmente já os tem, sem fazer nenhum esforço. É um eleitorado cativo, sua “reserva de contingência eleitoral”.

Mas, se não for além dessa parcela do eleitorado, Coser tem um “teto muito baixo” e já entrará na campanha fadado a perder de novo para Pazolini, ainda que passe para o 2º turno – repetindo, assim, a história de 2020. O eleitorado ideológico de esquerda não garante por si o triunfo de ninguém em Vitória.

Assim, o grande desafio do petista é dialogar com eleitores do centro para a direita que não dão um voto tão ideológico e que talvez estejam insatisfeitos com a atual administração – inclusive, por conta do aumento da violência na Capital captado pelas estatísticas mais recentes.

Daí a estratégia, antecipadamente executada, de bater em Pazolini desde já, e fazê-lo de forma bem pesada, expondo eventuais deficiências da atual administração – ainda que num tom exagerado que flerte às vezes com o sensacionalismo.

É um tom, no entanto, que pretende chegar a quem precisa chegar.

A foto tem João e tem rosa. Só faltou o Guimarães. Mas Coser não tem distribuído flores em suas redes sociais ultimamente. Foto: Reprodução Instagram

Ao fazer publicações em série que fogem tanto do seu tom habitual e do seu perfil natural, Coser (leia-se Fernando Carreiro) pretende atingir justamente um público diferente do que já vota nele. Quer chegar, ao contrário, exatamente em quem não vota nele. Pretende, em última análise, atingir os eleitores de centro e, principalmente, de centro-direita.

É com esse eleitor à direita que Coser quer encetar um diálogo… Ao adotar uma linguagem “mundo cão”, atacar Pazolini, chamá-lo de “amarelão”, usar letras garrafais, exagerar números (aí não vale, é gol de mão), Coser não está falando com a sua tradicional esquerda, mas tentando iniciar uma “conversa” com a direita. Aí se trata de um “povo estrangeiro” para ele. E, para falar com um estrangeiro, você precisa falar na língua dele.

O entendimento da campanha é que, usando a própria linguagem (tão agradável aos ouvidos da esquerda e facilmente compreendida por esta), Coser esbarra de saída em uma barreira linguística intransponível entre ele e os eleitores de direita, como se ele falasse o húngaro de Chico Buarque e eles compreendessem o russo de Vladimir Putin.

Se quisermos filosofar um pouco, é pela língua que se compreende o mundo, que se forja a nossa visão de mundo e compreensão da realidade.

Não seria possível, pois, tentar conversar com a direita falando a mesma língua da esquerda. São códigos linguísticos totalmente distintos. Para Coser transpor a própria bolha e o muro comunicacional que o separa da direita, ele precisa passar a se comunicar em linguagem que seja inteligível para os habitantes da outra bolha, de um jeito que eles possam entendê-lo.

O tom, enfim, tem sido esse descrito acima porque é mesmo calculado para ser assim. E exatamente por esse tom histriônico, premeditadamente histriônico, Coser espera começar a chegar a setores do eleitorado nunca antes desbravados por ele.

O resultado da estratégia é incerto, mas a explicação é essa, do ponto de vista pragmático.

O risco, é claro, é a campanha errar a mão, carregar demais nas tintas e fazer Coser passar do ponto, sair demais do tom, soando artificial.

No limite, o candidato pode passar a parecer um personagem político inautêntico, que guarda pouco ou nada do verdadeiro João Coser, como um fantoche nas mãos de um ventríloquo que fala (ou posta) por ele.

Aguardemos o desenrolar da campanha.


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