fbpx

Coluna Vitor Vogas

Assembleia aprova mudanças na eleição da Mesa Diretora, que ficará maior

Aprovada sem ninguém se dar conta, novas regras para composição da Mesa impactam sensivelmente o processo de articulações visando à eleição do próximo presidente do Poder Legislativo Estadual

Publicado

em

Deputados estaduais comemoram a eleição de Marcelo Santos para a presidência da Assembleia (01/02/2023). Crédito: Lucas S. Costa/Ales

Quase ninguém notou, quase ninguém percebeu, passou batido para quase todo mundo (talvez até para alguns deputados)… mas a Assembleia Legislativa aprovou, na semana passada, mudanças bem relevantes nas regras para a eleição e a composição da Mesa Diretora. A mais importante delas é o próprio tamanho da Mesa, que agora fica “mais larga”: a partir da próxima eleição interna, em 1º de fevereiro de 2025, passará a ser composta por mais três membros. Historicamente, são sete; no próximo biênio, serão dez.

> Quer receber as principais notícias do ES360 no WhatsApp? Clique aqui e entre na nossa comunidade!

A Mesa Diretora é composta por três membros titulares: o presidente e os dois primeiros secretários. Isso segue inalterado. O que muda é o número de “reservas”. Hoje, além dos três titulares, a Mesa é formada pelo 1º vice-presidente, pelo 2º vice-presidente, pelo 3º e pelo 4º secretários.

Receba as notícias da coluna no grupo de Whatsapp do Vítor Vogas.

A partir da próxima eleição, além dos cargos já existentes, fica criado um 3º vice-presidente e, podem acreditar, um 5º e um 6º secretários.

A mudança foi incluída em meio a um enorme projeto de resolução apresentado pelo atual presidente, Marcelo Santos (União Brasil), e votado muito rapidamente na última terça-feira (3), em regime de urgência, durante sessão virtual e extraordinária, basicamente sem discussão alguma. Foi um clássico jabuti: mudança legislativa incluída em meio a um projeto que versa sobre tema completamente diverso.

Não há menção a mudanças na estrutura e na eleição da Mesa nem na ementa nem na justificativa, muito menos se mencionou esse ponto durante a votação a jato. Mas de fato estava lá no meio do extenso projeto, que alterou vários outros pontos do Regimento Interno e de outras resoluções da Assembleia. O projeto foi aprovado e, por tratar de questões internas, prescinde de sanção do governador. A Resolução nº 10.313, de 4 de setembro de 2024, já foi publicada no Diário do Poder Legislativo.

Na prática, a nova regra, com a Mesa composta por dez membros, muda pouco ou nada em relação a poderes e atribuições. A resolução nem especifica competências para os três cargos criados. Serão só mais três na linha de substituição dos titulares na condução dos trabalhos em plenário.

Os três titulares continuam sendo aqueles que realmente “importam”… E, a bem da verdade, quem manda mesmo na Assembleia hoje é a figura do presidente da Mesa. Desde os tempos de Theodorico Ferraço (PP) no cargo, o Poder Legislativo Estadual vem passando por um processo de concentração de poderes nas mãos do presidente e de esvaziamento das competências dos demais.

O processo foi intensificado durante os seis anos da Era Erick Musso (2017-2023) e continua sendo aprofundado por Marcelo Santos desde que ele chegou à presidência, em 1º de fevereiro do ano passado. Antigamente, para validar atos administrativos internos – nomeações e exonerações, por exemplo –, o presidente precisava da assinatura de pelo menos um dos dois secretários titulares. Isso acabou durante os anos de presidência de Erick.

Na chegada de Marcelo à presidência, com o apoio pessoal de Renato Casagrande (PSB), o governador chegou a se dizer favorável à revisão desse acúmulo de poderes, mas não condicionou seu apoio a isso. Marcelo não fez nem menção de abrir mão de poderes acumulados. Ao contrário.

Um exemplo recente está na mesma resolução que criou três cargos na Mesa. A figura do corregedor-geral da Assembleia foi esvaziada sensivelmente, com grande parte de suas atribuições históricas sendo agora transferidas para o presidente da Mesa (Marcelo).

Então o que é que muda de verdade com o aumento de sete para dez membros da Mesa Diretora e por que tal mudança foi feita?

Mudanças profundas na eleição

O efeito prático disso tem muito menos a ver com o dia a dia da Casa do que com o processo de eleição da Mesa. No cotidiano da Casa, um supérfluo 3º vice-presidente e os ainda menos necessários 5º e 6º secretários não farão a menor diferença. Número é o que farão.

Já no processo de articulações internas visando à eleição da Mesa, a mudança numérica fará considerável diferença, sobretudo no mês de janeiro: agora, basicamente, para poder ser registrada, uma chapa precisa reunir nada menos que dez deputados, ou seja, um terço (1/3) dos parlamentares. É gente pra caramba.

Isso muda toda a lógica do jogo e das estratégias pré-eleitorais.

Em tese, pode ficar mais difícil registrar uma chapa, mas quem conseguir registrar uma chapa já estará muito perto da vitória, por uma questão matemática. Para se eleger, a chapa precisa da maioria absoluta dos votos: 16. Uma vez registrada, a chapa só precisará conquistar mais seis votos para assegurar a vitória matemática.

A tendência é que isso acentue a importância do período pré-eleitoral, ao longo do mês de janeiro.

Tradicionalmente, o que define mesmo a eleição da Mesa da Ales são as articulações anteriores à votação em 1º de fevereiro. Na sessão especial de votação, os deputados já chegam com tudo definido e com uma única chapa no jogo (aquela que prevaleceu nas articulações). A votação, aberta e nominal, acaba sendo o cumprimento de uma formalidade para homologação da chapa predominante.

Não há inscrição de duas chapas nem disputa no voto em plenário desde 2003. No início do ano passado, quase houve, com a disputa nervosa de bastidores entre os grupos de Marcelo e o de Vandinho Leite (PSDB). Mas, na reta final, o apoio explícito do governador e o jogo forte do Palácio Anchieta desequilibraram a disputa em favor de Marcelo, levando Vandinho a desistir de bater chapa e a compor com o atual presidente.

De todo modo, matematicamente, 1) as chances de inscrição de duas chapas, até então, eram muito maiores; 2) se duas chapas fossem inscritas, haveria outros 16 votos em disputa; 3) para garantir a vitória, com maioria absoluta dos votos, uma chapa de sete membros teria de conquistar mais nove votos.

Agora, matematicamente, 1) as chances de inscrição de duas chapas diminuem; 2) se duas chapas forem inscritas, haverá outros 10 votos em disputa; 3) para garantir a vitória, com maioria absoluta dos votos, uma chapa de 10 membros terá de conquistar só mais seis votos.

Então, de novo: quem chegar a registrar uma chapa já estará com uma mão na taça, dificultando bastante o lançamento de uma chapa alternativa.

E é por aí, presumivelmente, que passa o raciocínio de Marcelo, o autor dessa alteração das regras. Por que ele fez isso? Qual a sua estratégia? Como ele pode se beneficiar com a nova lógica introduzida ao processo eleitoral?

A candidatura de Marcelo à reeleição

Marcelo é candidatíssimo à reeleição e pode mesmo se candidatar, conforme entendimento fixado pelo STF: é permitida uma (e apenas uma) recondução à presidência da Assembleia, não importa se dentro da mesma legislatura. Conservar o poder do Legislativo Estadual é condição sine qua non para o sucesso do plano de crescimento político no Espírito Santo traçado por Marcelo.

Como atual presidente, ele larga com enorme vantagem sobre qualquer potencial concorrente. Além dos superpoderes acumulados – por exemplo, o controle total e pessoal sobre nomeações e exonerações de comissionados ligados à Mesa, moeda de troca usada ali e alhures desde sempre –, ele hoje realmente é respeitado por colegas de todas as colorações. Construiu quase uma unanimidade em plenário, por sua condução.

Sendo assim, Marcelo, em tese, não terá dificuldades em montar a “chapa da situação”. De pronto, isso tende a dificultar a formação e o lançamento de qualquer chapa alternativa… a menos que…

Preocupações no Palácio Anchieta

A menos que o Palácio Anchieta decida inverter sua posição, entrando fortemente de novo na eleição do outro Poder e jogando pesado novamente, mas dessa vez para derrotar Marcelo.

Dentro do Governo Estadual, já tem gente defendendo esse giro de 180º, com a formação de uma chapa com o selo do Palácio Anchieta, alternativa ao movimento de Marcelo. Se confirmada, essa inversão de lado será uma grande ironia: foi o governo – especificamente, Casagrande – quem colocou Marcelo ali. Num intervalo de dois anos, a mesma mão que o ergueu trabalharia para derrubá-lo. O elixir que deu força política inaudita a Marcelo Santos se transformaria em veneno para ele, dois anos depois.

Institucionalmente, a relação entre os dois Poderes e os respectivos chefes segue ótima, sem trepidações: o projetos importantes para o Espírito Santo (e/ou para o governo) são pautados e votados sem problemas – e, em geral, sem o menor vagar.

Politicamente, porém, a relação já esteve bem melhor. Casagrande e seu núcleo duro não digeriram bem alguns recentes movimentos de Marcelo, também visando à expansão dos seus poderes – mas externamente à Assembleia, no campo partidário e eleitoral.

O mais emblemático foi a sua tentativa franca de tomada do União Brasil no Espírito Santo, passando por cima de Felipe Rigoni, O movimento de Marcelo foi contido – ou, pelo menos, refreado. E o foi, em grande parte, por ação de Casagrande, que entrou pessoalmente no circuito e interveio junto ao presidente nacional do União, Antônio de Rueda, a fim de manter o União com Rigoni.

O governo tem monitorado os passos de Marcelo. No Palácio Anchieta, sua gradativa e silenciosa concentração de superpoderes é observada com atenção e já desperta preocupação, temperada com boa dose de cautela.

Um presidente hipertrofiado não convém ao Poder Executivo. Aqui e ali, alguns conselheiros palacianos já alimentam a tese de que é preciso conter esse crescimento.

Mesmo porque, se mantém boa relação com Casagrande e pode ser considerado seu aliado, Marcelo não é politicamente subordinado ao governador, não é produto do seu grupo político, não é “Casão Futebol Clube”, tampouco lhe deve lealdade canina. Tem perfil muito mais independente, aspirações próprias e projeto político idem. Suas movimentações eleitorais, por exemplo, podem ou não coincidir com as do Palácio. Ora convergem; ora, não.

Aliás, uma aposta da coluna é que, apoiando um sem-número de candidatos praticamente nos 78 municípios, Marcelo deve sair como um dos grandes vencedores desta eleição municipal no Espírito Santo.

Não é demais lembrar que, mesmo em 2023, Marcelo não era o candidato ideal nem o nome preferido inicialmente pelo governo Casagrande. Foi o candidato viável, e o governador preferiu bancá-lo a pagar para ver a ascensão de Vandinho à presidência, à frente de uma chapa com opositores dele.

Agora, pode ser chegada a hora de o governo enfrentar Marcelo Santos.

Mas é aquilo: hipertrofiado ele já está – graças à força do próprio governo. A grande ironia é que agora pode ser tarde demais para o Palácio.

Casagrande, mais uma vez, pode ter tirado da lâmpada um gênio sobre o qual não tem mais controle algum.

AS MUDANÇAS NO TEXTO

O número de membros da Mesa

A mudança capital se deu no parágrafo 1º do artigo 16 do Regimento Interno.

Como era

Art. 16, § 1º. Para substituir o Presidente, haverá 1º e 2º Vice-Presidentes, e para substituir os 1º e 2º Secretários, haverá 3º e 4º Secretários.

Como ficou

Art. 16, § 1º. Para substituir o Presidente, haverá 1º, 2º e 3º Vice-Presidentes, e para substituir os 1º e 2º Secretários, haverá 3º, 4º, 5º e 6º Secretários.

Votos automáticos

Outra mudança importante se deu no artigo 9º do Regimento Interno, que trata do processo de votação. Na prática, anula-se qualquer possibilidade de traição ou mudança de lado de última hora: o voto de cada um dos dez membros de uma chapa será automaticamente computado para aquela chapa.

Como era

Art. 9º, II. Chamada nominal dos Deputados, pelo 1º Secretário, que responderão qual a chapa de sua preferência.

Como ficou

Art. 9º, II. O Deputado terá automaticamente o seu voto registrado a favor da chapa que integrar como membro efetivo ou suplente;

Art. 9º, III. Chamada nominal dos Deputados que não sejam candidatos, pelo 1º Secretário, que responderão qual a chapa de sua preferência.

Fim oficial das indicações de partidos e blocos

Como era

Art. 9º, I. registro, junto à Mesa, por chapa, de candidatos previamente escolhidos pelas bancadas dos partidos ou por blocos parlamentares, respeitando, tanto quanto possível, o princípio da representação proporcional;

Como ficou

Art. 9º, I. registro, junto à Mesa, de chapa completa, indicando os nomes e contendo as respectivas assinaturas dos candidatos a Presidente, Vice-Presidentes e Secretários, respeitando, tanto quanto possível, o princípio da representação proporcional;

Ainda foi acrescentado o seguinte parágrafo único:

Para efeito de registro de chapa e votação, serão consideradas as manifestações individuais dos Parlamentares, independentemente das bancadas dos partidos ou dos blocos parlamentares.


Valorizamos sua opinião! Queremos tornar nosso portal ainda melhor para você. Por favor, dedique alguns minutos para responder à nossa pesquisa de satisfação. Sua opinião é importante. Clique aqui