fbpx

Coluna Vitor Vogas

Armandinho vai se filiar ao PL para voltar à Câmara de Vitória

A vida do vereador convertido em herói do bolsonarismo nos primeiros 90 dias após a soltura, enquanto prepara um “retorno por cima” à política do ES

Publicado

em

Armandinho Fontoura abraça mulher ao sair da Penitenciária de Segurança Média I, em Viana (19/12/2023)

No primeiro fim de semana após sair da prisão por decisão do ministro Alexandre de Moraes, em 19 de dezembro de 2023, o vereador afastado Armandinho Fontoura foi visto abraçando e sendo abraçado efusivamente por garçons e frequentadores do Di Dom Dom, tradicional bar de esquina do Triângulo das Bermudas, zona boêmia da Praia do Canto. É o reduto eleitoral de Armandinho.

> Quer receber as principais notícias do ES360 no WhatsApp? Clique aqui e entre na nossa comunidade!

Ele estava matando as saudades do local e dos convivas. De cabeça raspada, vestia trajes muito parecidos com o uniforme obrigatório de detento da Penitenciária de Segurança Média I, em Viana, onde passara os últimos nove meses: camiseta branca de meia manga e calça comprida e larga preta. Estava espantosamente pálido e famelicamente magro, após ter perdido cerca de 30 quilos no ano vivido atrás das grades.

Receba as notícias da coluna no grupo de Whatsapp do Vítor Vogas.

Passados três meses desde então, Armandinho recuperou cerca de 10 dos 30 quilos perdidos. Já não veste a roupa de detento, que deu lugar à inseparável tornozeleira eletrônica. Nestes quase 100 dias de liberdade, tem dado e recebido inúmeros outros abraços (além de tapinhas nas costas). Afastado do mandato desde o primeiro dia de 2023, o vereador voltou a fazer aquilo que sempre fez desde os tempos de assessor parlamentar, militante da Juventude do PSDB e organizador de manifestações pelo impeachment da então presidente Dilma Rousseff (PT): política.

Ele não tem vida social noturna. Não o convide para nenhum evento ou reunião depois das 20 horas. Por força de uma das cautelares impostas por Moraes no despacho em que decidiu soltá-lo, como alternativa à prisão, Armandinho precisa estar recolhido em casa desse horário até às 6 horas da manhã. Mas isso não quer dizer que ele não esteja se movimentando, em termos políticos, partidários e eleitorais. Muito pelo contrário.

Após voltar a exercer (com restrições) o seu direito de ir e vir, Armandinho está determinado a voltar a exercer a atividade parlamentar, pela via da Justiça e/ou das urnas, isto é, por decisão de Moraes ou do povo – aquela mesma que o ex-presidente Bolsonaro se empenhou muito em desrespeitar.

Em janeiro de 2023, por decisões da Justiça Estadual em uma ação civil pública e em uma ação penal, ambas movidas pelo MPES, Armandinho foi afastado do mandato na Câmara de Vitória. Em dezembro passado, Moraes também o afastou cautelarmente. Ao decidir soltar o vereador, o ministro o proibiu de voltar ao exercício das funções parlamentares.

Agora, a defesa de Armandinho tem se empenhado em convencer Moraes a reverter todas as cautelares, sustentando estar provado a esta altura que ele não representa risco algum ao Estado Democrático de Direito. Para isso, conta com um novo trunfo: as conclusões dos relatórios de três policiais federais escalados para destrinchar o material apreendido na residência e no gabinete de Armandinho no dia 15 de dezembro de 2022, no bojo do inquérito sobre os atos depredatórios da Praça dos Três Poderes por radicais bolsonaristas.

Também por decisão de Moraes, Armandinho foi incluído nessa outra investigação igualmente sob relatoria do ministro. O resultado vale como um “nada consta”. Foram revirados os arquivos do vereador na nuvem, nos dados telemáticos, computadores, pendrives e documentos físicos apreendidos. Não foi encontrado nada que pudesse minimamente associá-lo ao 8 de janeiro.

“A análise do item acima não revelou indícios ou elementos relevantes para a investigação no contexto das manifestações antidemocráticas ocorridas em janeiro de 2023”, escreveram, de forma padrão, os três agentes federais integrantes do Grupo de Investigação Lesa Pátria.

Essa é a via jurídica.

No entanto, se Armandinho não recuperar, até 31 de dezembro, o mandato para o qual foi eleito em 2020, há um novo pleito municipal no meio do caminho. O vereador está livre, não está inelegível nem proibido de concorrer. De qualquer forma ele vai se candidatar e, em caso de êxito nas urnas, será empossado no próximo dia 1º de janeiro como um dos 21 vereadores de Vitória na próxima legislatura, de 2025 a 2028, independentemente de sua atual situação judicial.

E é precisamente nisso que ele está apostando. Enquanto seu advogado, Carlos Zaganelli, se move na esfera jurídica, ele voltou a se movimentar com força na sua: a política. Com esse objetivo, o vereador tem participado, à luz do dia, de frequentes reuniões políticas e eventos sociais ao lado de antigos aliados, incluindo ex-colegas de vereança.

Também tem participado de conversas sobre filiação com alguns dirigentes partidários, principalmente de partidos de direita, entre os quais o seu passe foi valorizado depois que ele foi solto, num efeito reverso cuja lógica é a mesma que explica o fortalecimento da imagem do deputado estadual Capitão Assumção (PL) depois de ter sido preso e solto por ordem de Moraes. A diferença é que Assumção ficou por oito dias no xadrez, enquanto Armandinho passou 369.

Entre os grupos de direita radical, ou, simplesmente, entre os apoiadores mais fanáticos do ex-presidente Bolsonaro – que são muitos –, Armandinho foi alçado, por obra involuntária do MPES e de Moraes, ao status de herói… “um perseguido político que aguentou firme até vencer”, “um injustiçado pela ditadura da toga de Moraes que enfrentou o sistema e triunfou”, o símbolo vivo (e agora livre) dessa narrativa que tanto entusiasma e mobiliza os corações bolsonaristas.

Dentro dessa imensa bolha, Armandinho virou um popstar, como confirmam alguns recentes testes de popularidade. Seja numa feira livre de bairro de alta renda em Vitória, seja em uma praia frequentada por banhistas de altíssima renda em Guarapari, ele é parado até por desconhecidos para fotos e abraços. Aliás, lembram-se dos abraços com que abrimos este texto?

Armandinho decidido a ir para o PL

Pois é, exatamente por conta do que acabamos de expor, o maior abraço que Armandinho em breve dará é no Partido Liberal (PL), que também quer abraçá-lo. Justamente para consolidar esse novo status entre os bolsonaristas, nada melhor para ele que tentar voltar à Câmara pelo partido do ex-presidente.

Armandinho já tomou a decisão e está prestes a se filiar. Tecnicamente ele ainda está no Podemos, mas, com a janela partidária válida para os vereadores, ele pode trocar de partido até o dia 5 de abril sem risco de perder (em definitivo) o mandato. No dia seguinte, acaba o prazo para todos os pré-candidatos estarem filiados à sigla pela qual concorrerão.

Do ponto de vista pragmático – e Armandinho sempre foi um político bastante pragmático –, sua opção pelo PL faz total sentido dado o seu atual momento político, mas não deixa de ser curiosa.

A ojeriza de Armandinho pela esquerda e pelo PT sempre foi autêntica, haja vista sua militância em movimentos em prol do impeachment de Dilma na juventude. Originalmente, porém, ele não era o que poderia ser chamado de um radical de direita, tampouco um “bolsonarista”, como sugerem as suas raízes na social-democracia tucana. Foi se adaptando ao momento.

Como muitos políticos de direita que ascenderam no contexto da extrema polarização entre o bolsonarismo e o lulopetismo instaurada a partir de 2018, o político da Praia do Canto acabou sendo “empurrado” para o bolsonarismo. Por ausência de uma alternativa viável de direita na qual se agarrar, foi no embalo da extrema-direita encarnada por Bolsonaro. Se a escolha se reduziu a isso ou à esquerda petista, “vamos com isso”, concluíram tantos.

E assim foi Armandinho em seus dois anos como vereador… e assim vai ele mais que nunca agora, em sua nova empreitada eleitoral, desta vez pelo PL e como “ícone bolsonarista” em Vitória.

Se olharmos bem, mesmo em seus exaltados discursos na Câmara de Vitória, nas sessões plenárias e reuniões da CPI da Cesan entre 2021 e 2022, o alvo maior de Armandinho não era o PT, o STF, o “comunismo” – muito diferentemente, por exemplo, do colega Gilvan da Federal. Ele nem era tanto de ecoar, por exemplo, como um Capitão Assumção, as falas de ensaio golpista de Bolsonaro, com ataques sistemáticos ao STF, ao TSE, às urnas eletrônicas, o flerte aberto com um golpe de Estado e o não reconhecimento da vontade popular soberana expressa pelo voto.

A bem da verdade, Armandinho foi incluído por outros motivos na petição levada a Moraes pela procuradora-geral de Justiça Luciana Andrade, em novembro de 2022 (a famigerada Pet 10590), como um dos supostos membros de uma milícia digital privada erguida em torno do jornalista Jackson Rangel, com o objetivo de disseminar fake news, atentar contra as instituições do Estado Democrático de Direito e, acima de tudo, atacar a honra de representantes dessas instituições, segundo o MPES.

O vereador chegou a publicar artigos no blog de Rangel. Mas o que realmente representou sua danação foram discursos agressivos em plenário tendo por alvo autoridades locais da Justiça Estadual e do MPES, como a juíza de Direito Gisele Souza de Oliveira, o promotor de Justiça Rafael Calhau Bastos, a chefia do MPES e o TJES. Foi aí que ele rodou…

No dia 15 de dezembro de 2022, acolhendo a petição de Luciana Andrade, Moraes mandou prender o vereador.

A proximidade com Gilvan da Federal e a treta com Magno

Já que mencionamos Gilvan da Federal, é preciso dizer que é pelas mãos dele que Armandinho está entrando no PL – não pelas de Magno. Tratado por todo membro do PL como pré-candidato do partido ao Senado pelo Espírito Santo em 2026, o deputado federal já era muito próximo a Armandinho nos tempos de Câmara de Vitória.

A proximidade aumentou depois da soltura, até porque Armandinho reconhece no ex-colega de Câmara um dos seus maiores parceiros durante o difícil período na prisão. Sempre manifestou solidariedade e chegou a organizar uma manifestação em defesa de Armandinho e contra a decisão de Moraes na entrada do plenário da Câmara, dias após a prisão, em dezembro de 2022.

Agora mais unidos que nunca, os dois estão juntos no mesmo projeto de crescimento em Vitória.

Essas questões de filiação ao PL costumam ser conduzidas pessoalmente por Magno Malta, presidente estadual do partido e cacique da sigla no Estado há décadas. Contudo, o senador teve um estremecimento com Armandinho no ano passado. Isso por conta da “visita surpresa” de Magno ao então detento na penitenciária em Viana.

Para conseguir entrar nas dependências da carceragem, Magno pediu e obteve de Moraes uma autorização especial, por ser senador da República. Só que não comunicou antes à defesa de Armandinho, cuja estratégia naquele momento era evitar ao máximo qualquer tipo de vinculação política com os bolsonaristas mais radicais que vivem criticando o STF (e Magno é um dos maiores), para não prejudicar as próprias chances de “amolecer o coração de pedra” do ministro.

Armandinho receava que Magno fizesse exatamente o que costuma fazer nesse tipo de ocasião: estardalhaço. Muito engajamento e autopromoção nas redes sociais, nenhum resultado concreto.

Mas o vereador não teve escolha.

A contragosto, foi levado por agentes penais ao encontro de Magno. O senador manifestou solidariedade a ele e a outros presos na mesma operação. Perguntou se estavam sendo bem tratados. Armandinho teria lhe dito que agradecia pela solidariedade, mas que, se ele queria mesmo ajudá-los, poderia, como senador da República, procurar interceder junto ao gabinete de Moraes. Tudo acabou em oração puxada por Magno. O senador voltou à sua agenda. Armandinho, à sua cela.

Depois da soltura, os dois já se falaram por telefone. Colocaram o episódio em marmitex limpos. Isso não será nenhum impedimento para o ingresso de Armandinho no PL.

A expectativa interna é que, com o ganho de popularidade, Armandinho consiga um Carandiru de votos e, provavelmente, fique entre os candidatos mais votados em Vitória, ajudando a puxar mais vereadores para a bancada do PL (que hoje não tem nenhum representante na Câmara Municipal, por incrível que pareça).

O processo na Corregedoria

Em paralelo, além das decisões da Justiça Estadual que mantêm Armandinho afastado do mandato e da decisão de Moraes (superior às primeiras) que também o afastou cautelarmente, ainda paira outra espada sobre a cabeça do vereador, esta vinda da própria Câmara de Vitória.

É o processo por quebra de decoro parlamentar deflagrado pela Corregedoria da Casa em abril do ano passado a partir de representação protocolada por um empresário em março. No mês de junho, a vereadora Karla Coser (PT), em polo político oposto ao de Armandinho, foi sorteada relatora do processo na comissão. A instrução processual demorou bastante, até que, no comecinho deste ano, Karla finalizou seu parecer, recomendando a cassação de Armandinho.

Todos os prazos previstos pelo Código de Ética da Câmara já estão bem estourados, mas o presidente da Corregedoria, vereador Leonardo Monjardim (agora no Novo), não faz a menor questão de pautar o parecer de Karla. Como o processo interno demorou demais, o timing para se votar isso agora acabou sendo o menos conveniente possível para a grande maioria dos vereadores.

A maior parte ali é de direita, a começar pelo próprio Monjardim. Em muitas localidades do Brasil e do Espírito Santo, embora não em Vitória, o Novo está fechado eleitoralmente com o PL. Todos já estão no modo reeleição e, às vésperas da campanha eleitoral, já não cai bem para a maioria dos antigos colegas de Armandinho cassar o mandato de alguém que virou um ícone involuntário do bolsonarismo. Como os próprios eleitores lidarão com essa informação? Se ele ainda estivesse preso, talvez fosse diferente…

Por tudo isso, Armandinho confidencia a colegas que, se Monjardim vier a pautar o parecer de Karla para votação na Corregedoria, este provavelmente será arquivado. Mas, mesmo que seja aprovado e vá para votação final no plenário da Câmara, muito dificilmente passará. Não haverá votos para isso.

Herói acidental

“Ser ou não ser… bolsonarista?” Parafraseamos Hamlet, personagem shakespeariano. O bardo deu ao seu herói Romeu a linha “Sou um joguete do destino” (I am fortune’s fool). Jogado pelas circunstâncias para dentro e para fora da prisão, Armandinho se tornou um herói praticamente acidental da direita radical.

Em termos eleitorais, poderia agradecer ao MPES e a Moraes. Após ter passado um ano comendo o pão que o carcereiro amassou (e carne de cavalo ocasionalmente, conta ele a alguns conhecidos), Armandinho não se fará de rogado. Chegou a hora de tirar o melhor proveito da indigesta situação.

Bolado com Pazolini

Muitos outros vereadores e políticos em geral telefonaram a Armandinho para expressar solidariedade depois que ele voltou a sorver o doce ar da liberdade. Alguns mandaram mensagens através de advogados enquanto ele estava preso. Uma exceção foi o prefeito Lorenzo Pazolini (Republicanos), que o teria colocado na geladeira.

A pessoas mais próximas, Armandinho não esconde sua mágoa com o prefeito por não ter recebido nem sequer um contato dele, durante a temporada na cadeia e depois da libertação.

Se tivesse assumido a presidência da Câmara em janeiro de 2023, Armandinho na certa teria sido um chefe do Legislativo Municipal bem mais independente do que era Davi Esmael em relação ao Executivo. Mas ele sempre se considerou integrante da base de Pazolini em plenário.

Agora ele vai apoiar Capitão Assumção para prefeito.

Como matar… o tempo?

Na biblioteca do presídio, gerida por ninguém menos que Marcos Venicio Andrade, o assassino confesso de Gerson Camata, Armandinho conta aos amigos ter lido mais de uma centena de livros, por hábito mesmo (ele não tinha pena para remir). Também passou muito tempo ocupado na oficina de artesanato da penitenciária.

Quem diria? Marquinhos tem ajudado muitos presos a matar o tempo.

Relacionamento a distância

Armandinho está vivendo com a mesma namorada que tinha antes de ser preso. Ela escolheu esperá-lo. Por não ser parente consanguínea, ela não tinha o direito de ir visitá-lo na prisão. Ele chegou a considerar dar entrada em pedido de reconhecimento da união estável. Desistiu da ideia temendo a exploração negativa do tema pela mídia capixaba.

As cautelares impostas por Moraes

Por decisão de Moraes, de 18 de dezembro de 2023, Armandinho está proibido de usar redes sociais, de manter contato com outros investigados e de deixar a Grande Vitória sem autorização. Ele deve estar em casa antes das 6 horas e após as 20 horas. Deve comparecer toda segunda-feira ao cartório da Vara de Execuções das Penas e Medidas Alternativas (Vepema) em Vila Velha. Não pode exercer o mandato. E, claro, deve usar a tornozeleira eletrônica em tempo integral.


Valorizamos sua opinião! Queremos tornar nosso portal ainda melhor para você. Por favor, dedique alguns minutos para responder à nossa pesquisa de satisfação. Sua opinião é importante. Clique aqui