Coluna Inovação
Sem empreendedores e engenheiros não há indústria
A inovação tecnológica não é apenas pesquisa; é a ponte entre conhecimento, empreendedorismo e impacto no mercado
A economista italiana Mariana Mazucatto tem defendido o papel do estado nas inovações tecnológicas argumentando que grande parte delas aconteceram com base em investimentos feitos por órgãos de governo como o Departamento de Defesa nos Estados Unidos. De fato, Internet, GPS, telas touch-screen e tecnologias de comunicação surgiram de projetos de governo. Mas a aplicação prática se dá pela engenhosidade dos empreendedores buscando atender as necessidades e desejos das pessoas sem que elas precisem dizer o que desejam. Esse é o conceito de inovação: aquilo que vai para o mercado. Sem isso, muitas tecnologias ficam nas bancadas dos pesquisadores ou mesmo registradas em patentes que nunca são desenvolvidas. A União Soviética dominava muitas tecnologias mas não tinha empreendedores para colocá-las no mercado para o público.
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A história da Apple contada na biografia de Steve Jobs de Walter Isaacson e no livro “Jony Ive, o gênio por trás dos grandes produtos da Apple” de Leander Kahney nos mostra bem clara a criatividade dos empreendedores e o papel da engenharia e do design.
A concepção dos produtos não foi algo que se fez apenas desenhando em um software. O trabalho envolveu um profundo conhecimento de materiais, eletrônica e hardware. Houve necessidade de desenvolver novos materiais que atendessem as especificações de tamanho e espessura preconizadas para atender o que Jobs e Ive perceberam como a necessidade que o mercado queria. Estudaram tudo sobre alumínio, aço, acrílico, titânio, vidro, plástico, circuitos, antenas, telas touch. Para implementar as facilidades do movimento de pinça e arrasto na tela descobriram e compraram uma pequena empresa em Delaware, chamada FingerWorks de pesquisadores que criaram a tecnologia. Para o vidro do iPhone foram buscar um novo desenvolvimento pioneiro com a Corning Glass, tradicional indústria de vidros. A quantidade de patentes geradas para cada produto Apple é imensa.
Para o projeto original do iPod os engenheiros casaram um disco da Toshiba com uma bateria de celular e uma tela da Sony; um conversor digital-analógico de uma pequena empresa escocesa, um controlador de interface FireWire da Texas Instruments; um chip de memória flash da Sharp Electronics; um chip de gestão de energia e carregamento da bateria da Linear Technologies Inc; e um chip controlador e decodificador de MP3 da PortalPlayer.
Quando Jony Ive decidiu que o iMac seria transparente pediu que os designers trouxessem as peças coloridas e transparentes que pudessem encontrar como inspiração. Trouxeram uma lanterna traseira de BMW, vários utensílios de cozinha, uma garrafa térmica de um azul profundo e brilhante. De fato, o iMac final pareceu um casamento entre a garrafa térmica e uma luz traseira de automóvel. A imaginação está acoplada com o pensamento industrial e não pode ficar distante do ambiente de produção.
A produção de muitos dos equipamentos da Apple é feita em outros países, muitos na China(há grande movimentação para trazê-la de volta), não pela mão de obra barata, mas pela tecnologia mesmo de fabricação. Os engenheiros da Apple se deslocavam por semanas para as fábricas para acertar a produção. Fica clara a importância de conhecer profundamente os componentes e os processos industriais, sem o que ficaria impossível conceber adequadamente os produtos.
O exemplo da Embraer no Brasil mostra a importância do domínio da concepção dos produtos, mas também a capacidade de produção e o conhecimento para buscar os melhores componentes do mundo. A engenharia é fundamental para que se aproveitem as oportunidades de inovação e participação nas cadeias globais de valor.
Temos empreendedores, mas é pena que o Brasil ainda forme poucos engenheiros. A nossa capacidade de projetar e industrializar novos produtos fica seriamente comprometida.
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