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Round 6: psicólogo capixaba destaca seis reflexões sobre a sociedade

Mesmo com seu nível elevado de violência, a produção sul-coreana conquistou fãs no mundo inteiro

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Round 6. Foto: Divulgação/Netflix

Round 6. Foto: Divulgação/Netflix

Round 6 se tornou em 2021 a série mais popular da história da Netflix, superando Bridgerton. Mesmo com seu nível elevado de violência, a produção sul-coreana conquistou fãs no mundo inteiro. Mas, além do bom enredo, um outro aspecto chamou atenção na trama: a relação do dinheiro e de poder aquisitivo à integridade física das pessoas. Recheada de violência mórbida, suspense e drama, a obra chamou atenção de especialistas. Afinal, é uma narrativa sobre nossas sociedades. O que leva pessoas a arriscarem tudo por dinheiro? Quais os valores da vida? Veja a análise do psicólogo Alexandre Brito:

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1) O consumo nos consome: um vício em jogos segue o mesmo efeito da dependência em outras drogas, onde mesmo que você tenha conhecimento das possíveis consequências não há, necessariamente, um abandono ou desistência do vício. Quanto mais consumimos um jogo, mais nos tornamos apenas uma peça de seu tabuleiro e nos afastamos de nós mesmos. E a esperança (em ganhar ou recuperar o que perdeu) pode ser tudo o que resta. Sendo assim, todo jogo ou consumo desenfreado pode nos levar a um excesso que diminui o verdadeiro valor das coisas, tornando-as supérfluas. O que nos leva ao próximo item.

Alexandre Brito. Foto: Danielli Saquetto

2) Valor não é preço: a questão “qual seu valor?” é radicalmente diferente de “qual seu preço?”. Diante da carência de valores o que resta são os preços. Por exemplo, acreditar que não há nada a perder pode nos conduzir a caminhos perigosos e letais. Colocamos nossa vida e dignidade em risco ao abrir mão de valores importantes para nossa existência. Sendo assim, colocamos preço ao que seria impagável e o dinheiro acaba sendo identificado como a única fonte de felicidade ou restauração de tempo perdido. A suposta e milagrosa “última chance”. Agimos em acordo com as circunstâncias. Nestes casos, a ganância e o egoísmo podem brotar, como veremos no próximo tópico.

3) Egoísmo e competição – “ou eu, ou você”: nos jogos e competições em geral a vitória depende da perda e eliminação do outro. O outro é ameaça, é um perigo constante. Há o rompimento da possibilidade da vitória compartilhada. E vemos isso assumir diversas formas, como a cultura do cancelamento, as disputas desonestas por emprego, a prática da corrupção, lutas pelo poder, dentre outras. Eis o famoso “os fins justificam os meios”. Vale ressaltar que em geral nós temos uma imagem íntegra de si, mas nenhum ser humano está imune a se expor a essas situações e a ceder diante delas, o que nos leva à seguinte reflexão.

4) Nem sempre sabemos do que somos capazes: não sabemos do que somos capazes até que nossas mais altas ambições nos sejam prometidas ou quando nossa sobrevivência esteja em risco. Vale destacar que viver é diferente de sobreviver, pois no segundo caso entramos no “modo automático” ou vagamos sem saber que a morte já é uma companhia (como zumbis). Seja diante da possibilidade de realização de uma ambição ou na luta pela sobrevivência, podemos reagir de modo que vá contra nossos valores. Sequer nos reconhecemos. Vejam a situação de uma pessoa com dívidas severas: pode ficar exposta ao outro e se submeter ao que jamais faria em outras ocasiões. E não faltam oportunistas que visam o lucro diante disso, como veremos a seguir.

5) Um mercado sem sujeitos, onde todos são produtos: as pessoas podem ser tratadas como peças de jogos, reduzidas à números ou cifras. Nestes casos, uma vida não é vivida enquanto única, singular, mas apenas enquanto “só mais um”. Neste caso, o poder se veste de dinheiro. E com ele é possível comprar vidas e apostá-las enquanto diversão, bem como assistir e gozar com a tragédia alheia. Os jogadores são percebidos enquanto objetos de consumo, descartáveis. Seu sofrimento é parte do jogo, um modo de promover controle e dominação. Diante do medo e do sofrimento, por exemplo, há ainda mais dedicação ao jogo. Tudo isso faz com que as coisas sejam ainda mais perversas, como acontece em alguns trabalhos que nos remetem à escravidão. Aliás, vamos falar da escravidão em nossa última reflexão, com um modesto spoiler do que acontece logo nos primeiros episódios de Round 6.

6) A servidão voluntária: deixemos a reflexão mais amarga para o final. Ao aceitar entrar no jogo, diante de sua trágica situação financeira, os jogadores não sabem as consequências da vitória ou da derrota. Mas logo no primeiro jogo descobrem que pagam com a vida e têm a oportunidade de sair por meio de votação coletiva. Votam por sair e retornam para sua rotina cotidiana. A morte é assustadora, mas logo sentem que a vida fora do jogo é ainda pior. A responsabilidade e a liberdade são apavorantes. Seduzidos por um poder que não têm, se submetem voluntariamente e retornam (quase todos) aos jogos. Desta vez não há falta de conhecimento ou a armadilha da ignorância. Abrem mão da liberdade em nome dela mesma. Pode parecer paradoxal, mas isso é mais comum do que imaginamos.

Fonte: Alexandre Brito


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