Coluna Vitor Vogas
TJES: desembargador ficará no cargo por menos de três meses
Uma combinação de duas regras (promoção por antiguidade e aposentadoria compulsória aos 75 anos) produziu um caso concreto inusitado no tribunal

Fachada da sede do TJES. Crédito: Assessoria do TJES
Uma insólita combinação de duas regras relativas à carreira na magistratura (promoção por antiguidade e aposentadoria compulsória aos 75 anos) produziu no Tribunal de Justiça do Estado (TJES) um caso concreto, no mínimo, inusitado: entre a promoção, no dia 07 de dezembro de 2023, e a aposentadoria forçada, no próximo dia 28, o desembargador Jaime Ferreira Abreu permanecerá por menos de três meses no cargo de desembargador titular. A cronologia é a seguinte:
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07/12/2023: em votação no Pleno do TJES, aos 74 anos e nove meses de idade, o então juiz é eleito unanimemente desembargador, pelo critério de antiguidade. A eleição é praticamente o cumprimento de uma formalidade, pois ele era o primeiro da lista e, portanto, detinha a preferência. Ato contínuo, toma posse administrativa e começa a integrar a Corte como desembargador titular. Torna-se um dos cinco membros da Segunda Câmara Cível. Seu gabinete passa a receber processos normalmente para ele relatar, distribuídos por sorteio.
Na semana seguinte à promoção, vem a sessão solene de posse do novo presidente do TJES, Samuel Meira Brasil Jr. Em seguida, entramos no recesso judiciário.
01/02/2024: após sessão administrativa no Pleno para a abertura do ano do Judiciário, Jaime Ferreira Abreu toma posse em sessão solene. É agraciado com a Comenda Cruz do Mérito Judiciário, aprovada pelos colegas, “pelo notável desempenho ao longo da sua carreira jurídica e pelo carinho e consideração especial que tem devotado à magistratura capixaba”.
28/02/2024: Abreu completará 75 anos e será aposentado compulsoriamente. Terá permanecido por menos de três meses no cargo de desembargador. Até o momento, participou de duas sessões de julgamentos no Pleno: a que foi realizada logo após sua promoção e sua posse administrativa, no dia 7 de dezembro, e a da última quinta-feira (8), antes do Carnaval.
Desde abril de 2023, um juiz de 1º grau recebe R$ 35.710,46 por mês na Justiça Estadual. O salário de um desembargador é de R$ 37.589,96. Isso sem contar benefícios.

Jaime Ferreira Abreu toma posse administrativa como desembargador titular. Foto: Assessoria TJES (07/12/2023)
Respeitando-se a alternância de critérios, a nova vaga no Pleno, a ser aberta com a aposentadoria de Abreu, será provida por merecimento. Nesse caso, o/a novo/a desembargador(a) será escolhido/a pelos atuais integrantes do Pleno dentre os candidatos a serem inscritos. Em sessão especial a ser marcada pelo presidente do TJES, os atuais desembargadores votarão nos candidatos, formando inicialmente uma lista tríplice e, em último escrutínio, elegendo o/a próximo/a colega. O mais votado da lista será promovido a desembargador, sendo o ato de promoção assinado pelo presidente do TJES e publicado no Diário de Justiça.
Como funciona
Detentores de cargos vitalícios, magistrados são aposentados compulsoriamente ao completar 75 anos. Vale no STF. Vale, obviamente, no TJES.
Já as regras para promoção de juízes à segunda instância da Justiça Estadual são definidas pela Constituição Federal (art. 93), pela Lei Orgânica da Magistratura Nacional (art. 80 a 88), pelo Regimento Interno do TJES (art. 90 a 94) e pela Resolução nº 106/2010 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Na composição do tribunal, quatro quintos dos lugares são preenchidos por promoção dentre os juízes de Direito de Entrância Especial e um quinto por membros do Ministério Público Estadual (MPES) e advogados indicados em lista sêxtupla pelos órgãos de representação das respectivas classes (o chamado Quinto Constitucional).
A promoção de juízes de Direito é feita, alternadamente, pelos critérios de antiguidade e de merecimento.
É obrigatória a promoção do juiz que figure por três vezes consecutivas ou cinco alternadas em lista de promoção por merecimento.
Conclusão
Por evidente, não há nenhum demérito ao próprio desembargador Jaime Ferreira Abreu nesta história. Sua promoção foi um direito. A aposentadoria será um dever. Houve um encadeamento de eventos e uma interseção de regras que conduziram à presente situação.
Mas, como observado no início deste texto, permanência tão curta de um membro do Pleno no cargo é algo, no mínimo, inusitado.
Casos concretos como esse ensejam reflexões sobre a necessidade de se repensar a regra da aposentadoria compulsória e, principalmente, a da promoção por antiguidade na carreira.
Na última quarta-feira (7), a coluna enviou à assessoria de comunicação do TJES algumas perguntas sobre o tema. Também perguntou se o próprio desembargador Jaime Ferreira Abreu e o presidente do TJES, Samuel Meira Brasil Jr., gostariam de se manifestar sobre a situação em si e de opinar sobre as regras da aposentadoria compulsória e da promoção por antiguidade. Não recebemos resposta.
