Coluna Vitor Vogas
Presidente da Assembleia viaja para a Europa, deixando perguntas no ar
Segundo a assessoria da Casa, Marcelo Santos está em “missão oficial” para estreitar relações comerciais com o país do leste europeu e a Assembleia não gastará um centavo com isso, mas alguns questionamentos permanecem sem resposta até o momento: entre eles, se o presidente está acompanhado. Na noite de ontem, após insistentes perguntas, a Casa informou que Marcelo está pagando a “viagem oficial” do próprio bolso

Marcelo Santos, Renato Casagrande e o cônsul Gerardo Molina. Foto: Arquivo Presidência Ales
O presidente da Assembleia Legislativa, Marcelo Santos (Podemos), viajou para a Europa na manhã dessa quarta-feira (15) e só vai voltar ao Espírito Santo na sexta-feira da próxima semana (24). Oficialmente, de acordo com a assessoria de comunicação da Assembleia, o presidente viajou em missão oficial para a Eslováquia, no leste europeu, a convite do cônsul eslovaco no Espírito Santo, Gerardo Molina. Recentemente, Marcelo e o governador Renato Casagrande (PSB) se reuniram com o cônsul.
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Publicada na manhã dessa quarta-feira no site da Assembleia, a viagem deixou no ar algumas perguntas sem resposta até o momento. Sua realização suscita questionamentos encaminhados por mim à assessoria da Casa, em nome dos princípios da transparência e da publicidade nos atos dos agentes públicos, mas ainda não inteiramente respondidos.
Não está claro, por exemplo, se o presidente da Assembleia viajou sozinho ou acompanhado por algum familiar (a pergunta foi deixada sem resposta). Tampouco foi disponibilizada a programação oficial completa a ser cumprida pelo presidente na Eslováquia, com datas e horários dos encontros e das atividades oficiais.
Até a noite de ontem, também não estava devidamente esclarecido quem arcaria com os custos da viagem. Desde o meu primeiro contato pela manhã, a assessoria da Assembleia garantiu que a Casa não gastará um centavo do seu orçamento. Mas, inicialmente, não especificou quem está bancando a viagem.
Uma viagem internacional como essa é certamente onerosa, tem custo elevado com passagens aéreas, hospedagem, traslado e alimentação. É preciso conhecer esses custos e saber quem está arcando com as despesas.
Ante meus insistentes questionamentos sobre este ponto chave, a resposta veio na noite de ontem: Marcelo, segundo a assessoria, está pagando a viagem do próprio bolso… o que é no mínimo inusitado, em se tratando de “missão oficial”.
Antes de tudo, porém, o que chama a atenção, além da duração da visita, é a própria justificativa oficial da viagem: segundo as informações da assessoria, Marcelo está visitando o país europeu como uma espécie de embaixador do Espírito Santo, com o objetivo de melhorar as relações comerciais do Estado com a Eslováquia e abrir as portas para novos negócios, principalmente na área do comércio de gás natural e no setor moveleiro.
“O objetivo da visita é o estreitamento das relações comerciais com o país europeu em áreas como gás e petróleo. O convite para a missão especial foi feito durante recente encontro no consulado honorário da Eslováquia no Espírito Santo e do qual participou o governador Renato Casagrande (PSB). Naquela ocasião, o cônsul eslovaco no Espírito Santo, Gerardo Molina, foi categórico ao comentar o interesse no mercado capixaba”, informa a matéria publicada no site da Assembleia.
A maior parte do gás natural utilizado pela Eslováquia é importada da Rússia. Porém, devido à guerra com a Ucrânia, o preço do gás russo subiu muito, e a Eslováquia está buscando outros fornecedores pelo mundo.
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Contudo, em primeiro lugar, cabem dúvidas quanto a esse tipo de “missão” ser mesmo competência do presidente da Assembleia.
Não se trata do governador do Espírito Santo, do secretário estadual de Desenvolvimento, muito menos de uma comitiva de representantes do Espírito Santo, mas exclusivamente do presidente da Poder Legislativo Estadual. É claro que ele é uma autoridade púbica estadual e que, como chefe de Poder, cumpre um papel institucional. Só não me parece tão certo e cristalino que prospectar negócios para o Estado e representar o Espírito Santo no exterior em pautas da área econômica sejam prerrogativa do chefe do Legislativo.
As lacunas e as respostas, na ordem em que vieram
Por e-mail, por volta das 14h da tarde dessa quarta-feira, a assessoria da Casa me respondeu que Marcelo retornará ao Espírito Santo no dia 24; que as despesas relativas à viagem não serão pagas pela Assembleia Legislativa (ou seja, a viagem não terá custo para o contribuinte capixaba); que Marcelo perderá as sessões plenárias presenciais da próxima segunda (20) e da próxima terça-feira (21); que presidirá remotamente a sessão da próxima quarta-feira (22), a ser realizada no formato híbrido.
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Como dito, não foi informado se o presidente se fez acompanhar de alguém, nem a agenda oficial detalhada de Marcelo até o próximo dia 24. Nesse primeiro momento, também não foi especificado quem está financiando a viagem.
A seguir, reproduzo na íntegra as dez perguntas enviadas à Assembleia, com as respectivas respostas e lacunas:
1) Para que dia está previsto o retorno do presidente ao ES?
Retorno previsto para dia 24/3.
2) Qual é o motivo oficial e o interesse público da viagem?
O parlamentar foi convidado, juntamente com o governador, pelo governo eslovaco para visitar aquele país e estreitar relações comerciais, com foco em petróleo e gás, setor moveleiro e complexo portuário capixaba.
3) O presidente viaja sozinho ou acompanhado por familiares (esposa, filho, outros)?
O presidente está indo em missão oficial.
4) Quem arcará com as despesas relativas a passagens aéreas? Se for o Poder Legislativo, qual é o gasto total?
Não haverá qualquer gasto ao Poder Legislativo, nem passagens ou diárias.
5) Quem arcará com as despesas relativas a hospedagem, alimentação e traslado? Se for o Poder Legislativo, qual é o valor das diárias?
(Não respondido; pode-se inferir que se aplica a resposta anterior)
6) Qual é a programação oficial da viagem? Com quais autoridades o presidente da Ales vai se encontrar? Em quais dias e locais ocorrerão tais encontros oficiais?
O presidente será recebido pelo embaixador da Eslováquia no Brasil, Roman Hošták. Na agenda, visita a indústrias e ao centro administrativo daquele país. Além disso, o grupo deverá se encontrar com o embaixador brasileiro no país, Eduardo Gradilone Neto.
7) O presidente participará da sessão da próxima quarta-feira (22), no modelo híbrido?
Sim.
8) Tecnicamente, ele precisa se licenciar para realizar essa viagem?
Ele está em missão oficial autorizada.
9) Nos dias em que estiver fora do país, o presidente terá o salário descontado?
(Não respondida, mas com base na resposta anterior pode-se concluir que não, por ele estar, tecnicamente, em missão oficial)
10) Nas sessões presenciais de segunda (20) e terça-feira (21), ele terá o ponto cortado e o salário descontado?
(Idem)
Diante das respostas, insisti, também por e-mail, nos questionamentos abaixo:
1) Algum familiar do presidente o acompanha nessa viagem?
2) Se a Assembleia não está arcando com as despesas, quem está? O próprio presidente? O governo eslovaco?
À noite, perto das 20 horas, a assessoria enviou nova nota, reiterando informações anteriores:
“O presidente está indo em missão oficial autorizada pelo Parlamento e sem qualquer ônus ao Poder Legislativo. A viagem está sendo cumprida pelo parlamentar em busca de promover o Espírito Santo para promissores mercados que possam gerar riquezas em nosso Estado.”
Mas as duas perguntas específicas permaneceram sem resposta.
Finalmente, por volta das 20h30, a assessoria informou que é o próprio Marcelo Santos quem está pagando por toda a viagem.
A pergunta sobre possíveis acompanhantes continua não respondida.
Se o for, comprometo-me a publicar a resposta, bem como a agenda completa da visita.
