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Coluna Vitor Vogas

Mais Médicos: ES terá três vezes mais profissionais atuando neste ano

Entenda a reformulação do programa de fortalecimento da atenção primária no governo Lula e como a expansão da estratégia impacta o Espírito Santo

Publicado

em

Renato Casagrande e Nésio Fernandes

O número de profissionais atuando no Espírito Santo pelo programa Mais Médicos, do Governo Federal, vai triplicar só neste ano de 2023 – na verdade, vai mais que triplicar, a se cumprirem as previsões do Ministério da Saúde (MS). Esse foi um dos números mais importantes informados nessa segunda-feira (11), no Palácio Anchieta, durante a cerimônia de acolhimento dos novos médicos contratados para atuar em território capixaba dentro do programa federal de fortalecimento da atenção primária aos cidadãos. O evento contou com a presença da ministra da Saúde, Nísia Trindade, que se mostrou em fina sintonia com o governador Renato Casagrande (PSB).

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Com enfoque total na medicina da família e da comunidade como estratégia de saúde preventiva, o Mais Médicos foi criado em 2013, durante o governo Dilma Rousseff (PT). Desde o seu nascimento, esteve envolto em muita polêmica (ligada, em grande parte, a preconceito e incompreensão da proposta), por conta principalmente da participação de médicos cubanos.

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Após anos de enfraquecimento sob a administração de Jair Bolsonaro (PL), o programa foi reformulado e retomado sobre novas bases pelo governo Lula (PT) no primeiro semestre. A premissa maior da estratégia é que, fortalecendo a atenção primária, o poder público desafoga o Sistema Único de Saúde (SUS) nos níveis de maior complexidade: exames e consultas com especialistas, internações e cirurgias.

O objetivo é garantir atendimento básico e dignidade aos usuários do SUS em todos os territórios do país, incluindo os mais vulneráveis e os mais remotos, das periferias dos centros urbanos às comunidades indígenas e ribeirinhas na região amazônica, passando pelos pequenos municípios do interior.

O Mais Médicos foi retomado em fevereiro deste ano, logo após Nísia Trindade assumir o Ministério da Saúde. Em abril, o governo Lula publicou novo edital para reposição e ampliação do número de vagas, o maior da história, para profissionais atuarem no programa. Neste ano, o Mais Médicos já atingiu o recorde de profissionais em atuação, chegando a 18,5 mil médicos em todo o país e a uma cobertura de mais de 70 milhões de brasileiros assistidos.

Em julho, após aprovação no Congresso Nacional, o presidente Lula sancionou a lei que, na prática, reinstituiu o Mais Médicos. Em sua fala no Palácio Anchieta nessa segunda, a própria ministra da Saúde fez questão de agradecer ao Congresso, nas pessoas dos congressistas capixabas presentes, “pelo empenho na aprovação de um projeto de lei tão controverso, como vocês sabem, mas tão importante para os municípios brasileiros”.

Classificando as boas-vindas aos médicos ingressantes no programa como “um momento histórico”, a ministra frisou a importância e os benefícios comprovadamente gerados pelo programa desde sua criação, há uma década:

“É um programa estruturante, que leva acesso à saúde e à atenção primária a milhões de brasileiras e brasileiros e que certamente, como muitos estudos mostraram, desde a sua primeira edição, contribuiu para melhorar a qualidade de vida, reduzir a mortalidade infantil, ampliar de uma maneira muito importante a expectativa de vida de brasileiras e brasileiros.”

Faça as contas comigo

No início do ano – antes da retomada do programa e do lançamento dos novos editais –, havia precisamente 153 profissionais trabalhando no Mais Médicos no Espírito Santo.

A partir dos novos editais de chamamento abertos em 2023, outros 142 médicos já foram incorporados ao programa em território capixaba. Assim, até o momento, o número praticamente já dobrou, passando de 153 para 295 médicos ativos, distribuídos por 53 municípios.

Mas esse número ainda vai crescer. Segundo o Ministério da Saúde, ainda este ano, mais 202 médicos seguramente passarão a atuar no programa no Espírito Santo – dos quais 129 serão contratados em regime de coparticipação com os municípios, nas próximas semanas.

Com isso, a expectativa é que, até o fim do ano, o total de profissionais do Mais Médicos em atuação no Estado salte dos atuais 295 para 497. Se essa previsão se confirmar, o número vai mais que triplicar em relação àqueles 153 médicos que tínhamos no início do ano.

Hoje, segundo Nísia Trindade, o Mais Médicos já impacta a vida de 1 milhão de capixabas, pelo menos (algo próximo a 25% da população capixaba).

Se confirmado o incremento planejado pelo Ministério da Saúde, essa cobertura subirá para aproximadamente 1,5 milhão de habitantes, ou cerca de 40% da população capixaba, atendida por equipes do Programa Saúde da Família (PSF) composta por profissionais do Mais Médicos.

Segundo o secretário nacional de Atenção Primária à Saúde, Nésio Fernandes (PCdoB), para ter uma cobertura populacional adequada, o Espírito Santo precisaria ter cerca de 1,5 mil equipes completas do PSF atuando em seu território. Hoje, há perto de 1,2 mil equipes credenciadas, mas nem todas estão implementadas.

O Mais Médicos ajuda a suprir isso, na medida em que amplia a capacidade de recrutamento de profissionais, sobretudo para atenderem em municípios menores. Isso se explica, em grande parte, graças aos novos incentivos criados visando à permanência desses médicos nos rincões deste Brasilzão, a partir da remodelagem do programa.

Incentivos à permanência

Segundo Nísia Trindade, o MS decidiu criar incentivos à permanência desses profissionais, analisando os resultados de pesquisas acerca das principais causas de desistência.

Ao novo desenho do programa, foram incorporados, então, dois estímulos combinados, ou duas estratégias complementares: de um lado, a perspectiva de especialização durante a atuação no programa e de crescimento profissional, por conseguinte; do outro, a oferta de bolsas em valores bastante atraentes, mas condicionadas à permanência no programa por, pelo menos, quatro anos.

Segundo o MS, médicos e médicas agora têm quatro anos de permanência no programa para que possam realizar especialização e mestrado enquanto atuam nos territórios. Esse período de atuação ainda pode ser prorrogado por mais quatro anos, totalizando oito de permanência. Nesse novo modelo, os participantes receberão benefícios de acordo com o tempo de atuação, que podem chegar a quase R$ 500 mil (no caso de médicos formados no Brasil com FIES que permaneçam os quatro anos), o que tende a estimular a fixação em periferias e áreas de maior vulnerabilidade.

Grana

Dependendo de fatores como a duração do vínculo com o programa, as bolsas totais pagas aos participantes podem variar de R$ 70 mil a R$ 490 mil. Com os benefícios, diz Nésio, a remuneração do médico ou médica pode chegar a R$ 15 mil por mês.

No Poder Executivo Municipal, o teto remuneratório dos servidores pagos pela prefeitura corresponde ao salário do prefeito, que, em média, fica em torno de R$ 10 mil. Com a bolsa paga pelo Governo Federal, oferece-se ao profissional da área médica um incentivo financeiro para a sua fixação no município pequeno do interior.

Estudos e especialização

Em sua nova formatação, o Mais Médicos também passa a ter entre os principais objetivos estratégicos a formação de especialistas em atenção primária para o SUS. A lei sancionada em julho por Lula amplia a atuação do programa que, além de uma forma de provimento médico para regiões desassistidas, passa a ser uma grande Estratégia Nacional de Formação de Especialistas para Atenção Primária.

Enquanto atua no programa atendendo diariamente às comunidades, o médico ou médica poderá realizar uma especialização ou um mestrado profissional. Sua prática, inclusive, será supervisionada por tutores ou preceptores. Como define Nísia Trindade, agora o participante passa por um “processo educativo em serviço desde a sua origem”, “pensando nesse aprendizado na prática”.

O dedo de Nésio na reformulação da estratégia

Nitidamente, essa reformulação do programa, dando ênfase à formação de especialistas em atenção primária para abastecer as fileiras do SUS, tem, mais que um dedo, a mão inteira de Nésio Fernandes – ele próprio especialista e entusiasta da medicina da família e da comunidade.

Como secretário de Estado da Saúde, o agora secretário nacional de Atenção Primária à Saúde implementou estratégia muito parecida no Espírito Santo no governo passado de Casagrande, com pagamento de bolsas para médicos já formados atenderem em unidades de atenção primária espalhadas por municípios capixabas enquanto estudavam e se especializavam nessa modalidade de medicina. Os cursos são ministrados pelo Instituto Capixaba de Ensino, Pesquisa e Inovação (ICEPi), idealizado e praticamente “fundado” por Nésio na Secretaria de Estado da Saúde (Sesa).

O próprio Casagrande enfatizou a semelhança conceitual, em seu discurso no evento de acolhimento aos novos médicos no Palácio Anchieta. “Temos algo parecido a esse novo Mais Médicos. Por meio de parcerias com os municípios, os bolsistas fazem uma especialização oferecida pelo ICEPi enquanto são acompanhados por monitores e preceptores. Hoje temos 1,6 mil profissionais formando equipes multiprofissionais, com médicos, enfermeiros e dentistas.”

O objetivo, é claro, também é o fortalecimento da atenção primária. Ao que parece, a experiência capixaba, consubstanciada no ICEPi, pode ter servido de laboratório a Nésio. E pode ter sido o embrião que ele ajudou a inseminar nesse novo Mais Médicos, inaugurado este ano no governo Lula 3.

A dificuldade que persiste, segundo Nésio

Nessa nova modelagem, o Ministério da Saúde pratica a seguinte ordem de chamamento dos médicos inscritos para atuar no programa: primeiro são oferecidas vagas a brasileiros formados no Brasil, depois para brasileiros formados no exterior e, finalmente, para estrangeiros graduados no exterior.

Segundo Nésio, nos editais deste ano, só 14% dos convocados são formados no exterior (com diploma não revalidado), sendo 9% brasileiros e apenas 5% estrangeiros.

De acordo com o secretário, embora quase residual, esses estrangeiros ainda se provam importantes para o cumprimento da proposta do programa, que é chegar a todas as comunidades brasileiras, inclusive as de mais difícil acesso, visando universalizar o atendimento primário:

“Persistimos com dificuldades em recrutar profissionais formados no Brasil que queiram atuar nas áreas indígenas e territórios mais remotos do país. Por isso, consideramos que o recrutamento de profissionais médicos com registro no exterior continua sendo necessário para o nosso país.”

A fim de quebrar tabus e preconceitos, o secretário cita que 36% dos médicos que atuam na Inglaterra são formados em outros países.

Os convocados para o Mais Médicos que são formados no exterior e ainda não revalidaram o diploma de Medicina precisam passar por um curso de um mês de duração. Já os formados no Brasil se apresentam diretamente para a especialização.

A importância da atenção primária, por Casagrande

Em seu pronunciamento, o governador lembrou a maior dificuldade enfrentada pela saúde estadual durante seu primeiro governo (2011-2014):

“Os corredores dos hospitais estaduais viviam lotados. Tínhamos insuficiência de leitos na rede estadual. Praticamente todos os nossos hospitais viviam abarrotados de gente nos corredores. Acabou isso? Não, não acabou. […] Mas não temos mais aquele problema que a gente tinha. Então a gente rompeu um desafio grande. A gente vai vencendo desafios. E temos desafios enormes para vencer ainda, especialmente com relação a consultas e exames. Ainda é um desafio”, admitiu.

Ou seja, pensando na arquitetura do SUS, o desafio maior “desceu” da atenção terciária para a secundária.

Até para ajudar o governo a vencer esse atual desafio, Casagrande defende “uma atenção primária resolutiva”, para não sobrecarregar o SUS no segundo e no terceiro níveis de complexidade. “É por isso que é fundamental o programa Mais Médicos, com formação de profissionais, para que possamos ser resolutivos. Organizando a atenção primária, teremos um trabalho mais fácil.”

Conclusão de Nísia

“O Mais Médicos é um programa que todos os cidadãos esperam. Com todo o enfraquecimento do Mais Médicos no Governo Federal anterior, houve um grande vazio de assistência em muitos dos nossos municípios. Precisamos promover dignidade na atenção, levar médicos para essas regiões, que é um desafio num país tão desigual como o nosso. Por isso o programa tem tanto apoio das prefeituras e dos cidadãos.”