fbpx

Coluna Vitor Vogas

E agora, TCES? Como ficará o tribunal após o 4 a 3 na eleição?

O placar e sinais extraídos da sessão de votação gritam por si: o TCES que sai da eleição do próximo presidente é um tribunal politicamente rachado

Publicado

em

No sentido da leitura: Sérgio Aboudib, Luiz Carlos Ciciliotti, Domingos Taufner e Rodrigo Chamoun: o movimento vencedor. Crédito: TCES

Realizada a cada dois anos, a eleição interna para a presidência do Tribunal de Contas do Estado (TCES) é decidida, normalmente, por 7 a 0, com um só candidato na disputa sendo eleito unanimemente pelos sete conselheiros. Nesta terça-feira (31), ocorreu o contrário: no lugar do resultado mais amplo, o conselheiro Domingos Taufner elegeu-se presidente da Corte no próximo biênio com o placar mais apertado possível: 4 a 3.

> Quer receber as principais notícias do ES360 no WhatsApp? Clique aqui e entre na nossa comunidade!

Além do próprio Taufner, votaram nele o atual presidente, Rodrigo Chamoun – patrono de sua candidatura –, e os conselheiros Sérgio Aboudib e Luiz Carlos Ciciliotti. Taufner foi, por assim dizer, o candidato da situação.

Receba as notícias da coluna no grupo de Whatsapp do Vítor Vogas.

Derrotado por margem mínima, o atual vice-presidente, Rodrigo Coelho, foi o adversário de Taufner. Obteve, além do próprio voto, os dos conselheiros Sebastião Carlos Ranna e Sérgio Borges. Ao longo do processo, consolidou-se como o homem a ser batido por seu xará e atual ocupante da presidência. Não resistiu ao movimento interno pesado capitaneado por Rodrigo Chamoun.

A princípio, Coelho poderia arrogar-se a “preferência”. A vez agora seria dele, por um sistema informal de rodízio normalmente seguido pelos conselheiros, mas furado de quando em vez. Essa foi uma dessas vezes.

O placar apertadíssimo representa um daqueles casos típicos em que os números gritam por si: o TCES que sai dessa eleição é um tribunal dividido do ponto de vista político.

Mais que o placar em si, a constatação é reforçada por algumas evidências colhidas da cena em que se deu a eleição, na sala de sessões do TCES, às 14h30 desta terça-feira. Logo após a proclamação dos resultados, Rodrigo Coelho desejou a Taufner sucesso e que ele use “a sua energia para garantir a nossa unidade”.

O futuro presidente fez um discurso sereno. Foi sucedido por Rodrigo Chamoun. Coelho então, em um gesto mais que eloquente, fez questão de retirar-se do Pleno, para não ouvir o pronunciamento do atual presidente, artífice de sua derrota.

Sinais da cisão em plenário também puderam ser extraídos do próprio discurso de Chamoun, marcado por ao menos duas indiretas direcionadas a um ausente Coelho.

A primeira foi ao exaltar a importância da independência funcional das peças que compõem o TCES: “Conselheiro se metendo em trabalho de auditor é inadmissível. Não houve bala de prata. Não houve construção de herói que trouxe uma solução mágica na prateleira”.

A segunda foi ambivalente. O presidente fez uma longa citação de Sêneca, intelectual do Império Romano, para enaltecer qualidades percebidas por ele em Taufner. Elipticamente, deu a entender que tais predicativos faltariam a Coelho. Ao exaltar as virtudes de um, apontou, por contraste, os defeitos do outro. E o defeito maior, neste caso, seria a vaidade:

“A justiça nada tem a ver com a ambição ou a cobiça da fama, apenas pretende merecer aos seus próprios olhos. Acima de tudo, cada um de nós deve convencer-se de que temos de ser justos sem buscar recompensa […] Fazer publicidade da nossa virtude significa que nos preocupamos com a fama, e não com a virtude em si”, enunciou Chamoun.

“Esta Corte está destinada a fazer sempre as melhores escolhas para o momento. Hoje empreendemos excelentes decisões”, disse ainda o presidente, em seu discurso.

Chamoun confirma: articulou para derrotar Coelho

Logo após a sessão plenária, o atual presidente confirmou: não só votou em Taufner como o apoiou com entusiasmo: “É lógico que ele teve o meu voto e todo o meu entusiasmo! Confirmo ter sido apoiador dele”.

Mais que um apoiador, um articulador declarado:

“Sim, fui articulador da candidatura dele. Foi uma articulação natural. Acho que, por estar há quase quatro anos na presidência, tenho uma clareza maior das necessidades do tribunal. Tentamos costurar uma unanimidade, mas não foi possível. E aí fomos para o voto.”

Ele justificou sua escolha, entendendo-a como a melhor para o TCES neste momento:

“Essa divisão de pensamento é natural. Quando não há possibilidade de produção de unanimidade, precisamos ir para as escolhas. E eu realmente vi o conselheiro Domingos, neste momento, como o candidato mais preparado para tocar esse ciclo que fez do TCES referência no Brasil, por sua experiência e por já ter presidido o tribunal num momento difícil. O conselheiro Coelho tem as suas qualidades, mas neste momento precisei fazer uma escolha.”

Chamoun preferiu negar que a Corte saia dividida do processo:

“Não, não sai dividida. A disputa é normal. Há os momentos para a tomada de decisões difíceis. Nós temos uma estrutura muito clara, uma estratégia de longo prazo, e entendemos, por maioria, que o conselheiro Domingos reúne as condições para este desafio neste momento.”

O atual presidente também opinou que a disputa eleitoral representará “zero instabilidade” para o tribunal no próximo biênio e “nenhum problema para a gestão”, até por uma questão matemática sugerida por suas palavras: na verdade, a vitória de Taufner não foi por margem tão apertada.

Como o conselheiro Sérgio Borges se despedirá da Corte em dezembro, aposentando-se compulsoriamente por chegar aos 75 anos, a gestão de Taufner começará em janeiro com um placar real de 4 a 2 a seu favor (deixando apenas Coelho, quiçá Ranna, isolados numa oposição interna).

Dependendo do substituto de Borges a ser escolhido pela Assembleia em fevereiro – o secretário da Casa Civil, Davi Diniz, é o mais cotado –, essa correlação de forças pode ficar mais apertada para Taufner – que ainda assim terá a maioria – ou até ampliar-se para um 5 a 2.

“Instabilidade zero”, diz Chamoun. “Aqui as coisas são decididas por maioria. Na verdade, em janeiro, estaremos em seis no plenário. Vamos esperar o novo conselheiro. E, obviamente, o conselheiro Domingos tem o espírito aberto, postura de fácil trato e vai conseguir aparar quaisquer arestas pendentes. Mas temos planos claros que ficam acima das visões pessoais. É na condução desse planejamento que temos plena confiança.”

Domingos Taufner já presidiu o TCES por um biênio, de 2014 a 2015.

Taufner: “Disputa é natural”

Em entrevista após a sessão, o presidente eleito também rechaçou a ideia de uma Corte politicamente rachada:

“Não sai dividida. Tivemos uma disputa para o cargo de presidente. Fui eleito, daqui a dois anos haverá outra eleição. E, com a minha forma de trabalhar, qualquer resquício [de divisão] que possa haver com certeza será debelado.”

Taufner explica essa sua “forma de trabalhar”: “Como sempre trabalhei aqui dentro: tratando bem a todos e potencializando o trabalho de cada um. Todos os conselheiros serão tratados igualmente. Conversarei com todos, então isso não será problema”.

Ele refutou, ainda, que terá pela frente um trabalho de pacificação: “Pacificação não, porque, em cada eleição, é possível ter disputa por cargo de liderança, ainda mais hoje que o TCES tem alto índice de organização, o que é reconhecido até por outros tribunais, então é até natural que haja uma disputa”.

Rodrigo Coelho: “Que busque a nossa unidade”

Logo após a proclamação da sua derrota em plenário, Rodrigo Coelho pediu a palavra a Chamoun e fez um breve pronunciamento, no qual se dirigiu a Taufner, alfinetando Chamoun e explicitando qual será o desafio do futuro presidente: “O clima da instituição é reflexo da liderança. Espero que o senhor use a sua energia para garantir a nossa unidade”.

Coelho também desejou sucesso ao vencedor e agradeceu aos que votaram nele:

“Este processo que acabamos de vivenciar foi amplamente discutido. Muitas pessoas tiveram conhecimento dele. E eu gostaria de registrar minha gratidão aos colegas que, diante de toda a conjuntura estabelecida, confiaram em mim os seus votos. Fico muito honrado com os votos que tive e sou muito grato pelas orações e a todas as pessoas que de alguma forma torceram. Minha dedicação ao TCES será plena, como vem sendo sempre. Muito obrigado àqueles que acreditaram.”

Ranna: “Temos que começar um tempo de paz”

Na verdade, porém, o primeiro a apontar o elefante na sala foi Ranna. Decano do tribunal, o conselheiro tem sido representante da minoria política no TCES há exatos dez anos – precisamente, desde que não conseguiu se reeleger presidente da Corte, em outubro de 2013.

Coincidência ou não, o movimento na ocasião teve a participação de Aboudib e Taufner, levando o próprio Taufner a seu primeiro biênio na presidência.

Sem citar nomes, Ranna conclamou os colegas (precisamente, os colegas vencedores) a inaugurarem “um tempo de paz no tribunal”, passando a ouvir e a respeitar as diferenças:

“Há um provérbio na Bíblia que diz que há tempo de plantar e há tempo de colher. Há tempo de paz e tempo de guerra. Acredito que temos que começar aqui um tempo de paz, de cultivar cada vez mais o respeito às diferenças e às controvérsias, porque é na diferença que a gente cresce. É ouvindo o que o outro tem a dizer, que não é o que nós pensamos, mas que às vezes é a peça que falta para que nosso pensamento fique melhor. Acredito que sairemos fortalecidos desta eleição. Uma eleição simbólica, onde foram expostos os votos sinceros de cada um. E é bom lidar com a sinceridade e com a transparência. É o que nós pregamos e é o que nós precisamos fazer.”

Taufner preparou discurso antes

Como demonstramos aqui, a eleição do TCES foi decidida antes mesmo da votação. Na antessala do Pleno, os sete conselheiros chegaram a se reunir, numa última tentativa de chegarem a um consenso. Mais objetivamente, num último esforço por parte do grupo majoritário para demover a candidatura de Coelho. Foi em vão.

Mesmo sabendo que perderia no voto, Coelho entrou na sala de sessões disposto a marcar sua posição, e seus dois apoiadores mantiveram-se firmes com ele: Ranna (adversário interno de Aboudib e Taufner) e Borges (que não estará mais no tribunal).

Taufner, por sua vez, já entrou na sala sabendo que se sagraria vencedor. Tanto que já tinha um discurso prontinho para ser lido na tela do seu notebook – e de fato lido por ele –, com pelo menos três páginas, em fonte de bom tamanho. Discurso, obviamente, escrito antes.

No pronunciamento, Taufner agradeceu a Coelho pelas palavras e a confiança de todos os colegas, independentemente de terem votado nele ou não. Percorreu avanços logrados pelo tribunal desde os distantes tempos da presidência da falecida Mariazinha Vellozo Lucas, a quem prestou homenagem, passando por concursos públicos, a profissionalização do corpo técnico e, mais recentemente, ferramentas tecnológicas disponíveis ao público no site oficial do TCES, como o Sistema Cidades e o Painel de Controle.

Também destacou conquistas da sua primeira passagem pela presidência, no biênio 2014-2015, como o Planejamento Estratégico, a instituição do ensino a distância na Escola de Contas e o Processo Eletrônico, que passou a funcionar na gestão seguinte.

Em sua nova gestão, prometeu liderar o tribunal com base no Planejamento Estratégico e “dar continuidade à aproximação com a sociedade, inclusive com uso de linguagem simples em nossos documentos”.

Na entrevista após a eleição, Taufner expressou preocupação especial com o deficit previdenciário de muitos dos 34 municípios capixabas que possuem regimes próprios.

“É um trabalho iniciado por Chamoun e que eu quero intensificar. Temos vários municípios com deficit e alguns estão com dificuldades em pagar as suas contas. O TCES incentiva que os municípios façam sua reforma previdenciária nos termos da Emenda Constitucional 103/2019. No Espírito Santo, poucos municípios aderiram. E, enquanto não fizerem, os gastos vão aumentando muito.”

Outros eleitos e votos de protesto

O Pleno do TCES também escolheu nesta terça os ocupantes dos outros cargos de direção no próximo biênio. Por unanimidade, o conselheiro Luiz Carlos Ciciliotti foi eleito vice-presidente de Taufner – e essa foi a única escolha 100% consensual.

Para o cargo de corregedor-geral, foi reconduzido Sérgio Aboudib. Ele recebeu seis votos, mas um dos colegas votou em branco. A aposta é que tenha sido Coelho, em protesto pela articulação conduzida por Aboudib e Chamoun contra ele.

Para diretor da Escola de Contas, o próprio Chamoun foi eleito com cinco votos. Ranna recebeu um voto, mas disse imediatamente, em alto e bom som, que não partiu dele mesmo. Pode ter sido de Coelho. Outro conselheiro votou em branco (possivelmente, Borges).

“Quero agradecer a quem votou em mim. Não fui eu!”, disse Ranna. “Outro dia a gente conta os bastidores disso aí”, retrucou Chamoun, contendo o riso.

O bastidor é o seguinte:

Com o apoio de Chamoun, Aboudib, Taufner e Ciciliotti, o conselheiro Ranna será reconduzido a uma das vice-presidências da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon), na próxima eleição da entidade. Em troca, apoiou Chamoun para diretor da Escola de Contas do TCES.

Já a eleição para o último cargo, o de ouvidor do TCES, acabou num impasse que só poderá ser solucionado em janeiro, quando Taufner já for o presidente. Em dois escrutínios, todos os sete votaram em branco.

Taufner (presidente), Ciciliotti (vice), Aboudib (corregedor) e Chamoun (diretor da Escola de Contas) já exercerão os respectivos cargos para os quais foram eleitos. Borges se aposentará. O próximo ouvidor, então, só poderia ser Ranna ou Coelho. Mas nenhum dos dois quer o cargo.

O risco político para Coelho

O grande risco para Coelho, a partir de agora, é que ele caia em uma vala de total isolamento político e assuma um papel que, de certo modo, coube a Ranna nos últimos dez anos.

O TCES é formado por duas câmaras de julgamento. A primeira será formada por Ranna, Aboudib e Ciciliotti. O primeiro terá a presidência, mas os outros dois terão a maioria.

Já a segunda será composta por Rodrigo Coelho, Chamoun e o substituto de Borges, a ser escolhido pela Assembleia em fevereiro. Coelho terá a presidência, mas, dependendo de quem for o novo membro, pode ficar em minoria também ali.


Valorizamos sua opinião! Queremos tornar nosso portal ainda melhor para você. Por favor, dedique alguns minutos para responder à nossa pesquisa de satisfação. Sua opinião é importante. Clique aqui