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Mulheres vencem o medo e encontram na medida protetiva um basta para a violência

Vítimas e defensoras públicas mostram qual caminho seguir em caso de violência

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A violência doméstica pode se apresentar de diferentes formas, saiba identificar os sinais de violência. Foto: Freepik

Foto: Freepik

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Todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal. Essa prerrogativa, exposta no artigo três da Declaração Universal dos Direitos Humanos, às vezes não existe dentro das mais abstratas formas de violência contra as mulheres em relacionamentos abusivos.  

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Pode ser uma frase, disfarçada entre atitudes positivas, mas que carrega verdadeiras armas contra os direitos básicos de um ser humano.  

“Você está estudando mesmo ou enrolando? Estou achando que não vai passar nunca nessa prova!”.

“Como assim você vai sair com essa roupa? Não acha melhor trocar? Esse short está muito curto.”.

“Você é maluca! Gosta de arranjar confusão por nada.”.

“Mulher de cabelo curto é muito feio. Mas, fazer o quê, né? Vou esperar crescer…”.

“Se você prefere sair com as suas amigas em vez de ficar comigo, faz o que a sua consciência achar melhor.”.

“Você está louca! Isso é coisa da sua cabeça!”.

“Você tem sorte. Qualquer outro homem já teria te batido.”.

Depoimento de mulheres recolhidos pela reportagem sobre violência psicológica.

A medida protetiva

A manipulação e o domínio sufocam. Sufocam tanto, que não há forças para buscar ajuda. E fica cada vez mais difícil voltar a respirar sem ter o sentimento de medo. Os dias ficam mais longos e a liberdade também longe de ser alcançada. 

“Era eu pegar o celular, ele sentava do meu lado. Com quem você está falando? Eu não podia ter rede social, meu telefone não poderia ter senha, nem nada. Eu não podia ter amizade, todas as minhas amizades eram controladas por ele. Eu nunca pude tirar uma foto sozinha, só com ele.”.

Essa é a Kelly. Ela viveu por 17 anos dessa forma. Durante todo esse tempo, ela até percebeu que tinha algo de errado. Aquela situação não era normal. Mas, com dois filhos, acabava deixando acontecer, como varrer a poeira para debaixo do tapete.  

Essa situação pode se repetir exaustivamente por centenas de relacionamentos. Imagine estar vivendo este pesadelo, mas não se sentir à vontade para ir a uma delegacia. Ou, então, o nível de privação de liberdade é tamanho que a mulher sequer consegue efetuar uma denúncia sem que o parceiro saiba.  

No entanto, existe uma alternativa. Um caminho onde a mulher pode se manter segura, sem precisar de um boletim de ocorrência, de forma totalmente on-line, rápida e discreta. 

“As mulheres podem solicitar as medidas protetivas sem precisar de boletim de ocorrência. A medida protetiva não tem relação com o processo criminal. São medidas necessárias para preservar a integridade das mulheres. Se quiser procurar a delegacia, é uma decisão dentro da autonomia das vítimas. Mas, se quiser preservar a vida pedindo a medida protetiva e acionando o judiciário, elas podem fazer isso sem boletim de ocorrência.”.

Maria Gabriela Agapito é a coordenadora de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres da Defensoria Pública do Espírito Santo. Ela sabe o quanto é difícil para uma vítima pedir um socorro sem se expor. E, por isso, há um caminho discreto, mas extremamente eficaz para denunciar e pôr um fim nas mais diferentes violências sofridas. 

“É um simples formulário no nosso site em que as mulheres podem acessar a qualquer momento e a qualquer hora, de forma silenciosa. Dentro de 24 horas, a Defensoria Pública entra em contato. São mulheres que fazem esse atendimento, são defensoras públicas, especializadas no atendimento. A gente colhe os elementos e ajuíza. No dia seguinte da solicitação, a mulher já tem a medida protetiva ajuizada.”, conta.

E a Kelly fez esse caminho. Na verdade, ela está entre as mais de 1,3 mil mulheres que realizaram o pedido de medida protetiva de forma online pelo site da Defensoria Pública do Espírito Santo. Mesmo se o ex-parceiro tentar contato, Kelly se sente protegida e sem medo de ir atrás dos seus direitos.  

“A pessoa que relatou o meu caso colocou tudo bem relatado. Está lá: contato zero. Em relação as ofensas, redes sociais, inclusive com parentes, que são os filhos também. Meus filhos não aguentam mais. Ele usa os meus filhos para chegar até a mim. Perguntou para minha filha se eu observo as redes sociais dele, como se eu fosse perder meu tempo fazendo isso após uma medida protetiva. Será?”.

As violências

O que a Kelly vivenciava dentro de casa se categoriza como violência psicológica, que corresponde a 90% das queixas dos pedidos para medida protetiva que chegam à Defensoria Pública. As falas no início da reportagem são exemplos de violência psicológica.  

Quem observa isso diariamente é a Fernanda Prugner, defensora pública que atua há cinco anos na linha de frente, em contato direto com as vítimas. Ela compartilha um pouco do que vivencia dentro da defensoria e abre a discussão para aquilo que todos temem diante de um caso de relacionamento abusivo: o feminicídio, o assassinato da mulher.

“Precisamos falar em todos os momentos a respeito das violências, porque escutar outras mulheres que passaram por essa violência gera a identificação. O que a gente constata durante os  atendimentos, quando questionamos as mulheres, damos exemplos de violência e, na maioria das vezes, a mulher não sabe que aquilo se caracteriza como violência. Temos que falar cada vez mais para que não chegue no último caso, que é o feminicídio ou a tentativa de femincídio.”, relata.

De acordo com os dados do Anuário Estadual de Segurança Pública do Espírito Santo, no ano de 2022, mais de 36% dos casos de homicídio de mulheres foram classificados como feminicídio, quando o conjunto de agressões leva à morte, motivado apenas pelo fato de ser mulher. Além disso, em 92% dos casos o autor do feminicídio é o atual ou ex-companheiro da vítima. 

Com a medida protetiva, a mulher possui assistência social, de saúde e, em casos mais severos, ela pode ser encaminhada para uma casa de acolhimento, visando uma proteção maior contra o agressor. 

“Observamos um abalo psicológico muito grande e fazemos os encaminhamentos para a rede de saúde. Existe, também, o medo dos agressores tirarem os filhos, por exemplo. Em casos extremos, há o medo de que o agressor vá cumprir com as ameaças e acabe em feminicídio. Nesses casos, a gente oferece a casa abrigo, que é um lugar com o endereço sigiloso, e a defensoria faz o acompanhamento.”, conta a defensora.

Identificar os tipos de violência não é fácil. Realizar o pedido de medida protetiva é um ato de coragem e que pode salvar vidas. Conhecer os direitos é o primeiro passo. Viver em paz é o objetivo. 

“Eu posso acionar os meus direitos e isso me deixa segura. Eu estou em paz. Desde a medida protetiva, eu estou em paz.”, desabafa Kelly.

Como solicitar a medida protetiva no site da Defensoria Pública do Espírito Santo

Para realizar o pedido de medida protetiva de forma on-line, sem a necessidade de boletim de ocorrência, basta acessar o site www.defensoria.es.def.br, clicar no ícone Canal da Mulher e, em seguida, onde estará escrito “solicite aqui sua medida protetiva de urgência”.

Após preencher um breve formulário, a instituição tem até 24 horas para entrar em contato com a vítima. Entretanto, qual um pode ajudar uma mulher que está em risco. O disque 100, para denunciar, ou imediatamente a Polícia Militar, pelo 190.

Dessa forma, o artigo três da Declaração Universal dos Direitos Humanos que assegura a todos o direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal vai, a cada medida protetiva, ser muito mais uma realidade do que apenas palavras distantes da vida das mulheres.  


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