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Turismo no ES: o que dificulta o desenvolvimento do setor?
O turismo gera reflexos em diversos setores. O mercado de trabalho é um deles, além do aumento do número de empregos, ainda ajuda na circulação de capital

O turismo gera reflexos em diversos setores. Foto: Yuri Barichivich
O Espírito Santo é recheado de belezas naturais, diversidade cultural e diversos eventos regionais na região metropolitana e no interior. O estado está cheio de atrações para se tornar destino de viagem. No entanto, esse grande potencial ainda não é revertido em números de destaque no mercado turístico. Mas o que dificulta o desenvolvimento da área?
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O estado possui belezas escondidas por todo seu território, ainda que pouco conhecidas. Além disso, o território capixaba ainda é conhecido como sendo a “a praia dos mineiros”, sendo esses vistos como os principais turistas do estado por muitos capixabas. O hoteleiro e vice-presidente do Sindihotéis-ES, Gustavo Guimarães, chama atenção para essa fama. Segundo ele, mesmo possuindo esse histórico, a questão nunca foi trabalhada de uma forma comercial, profissional e efetiva. “O Espírito Santo possui esse público por ser mais conveniente, mais próximo, mais barato e vantajoso, não por ser algo trabalhado no turismo”, comenta.
Esse ponto de vista é também compartilhado pelo professor do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Ufes Tarcisio Bahia de Andrade ao explicar o fenômeno dos mineiros no estado. “O tal atrativo que se fala muito por aqui é a razão de recebermos principalmente mineiros, pois eles é quem realmente não têm praia perto”, diz.
A curta distância é um mito
Um fator, muitas vezes visto como uma vantagem no estado é a curta distância entre o mar até as montanhas, porém isso não passa de um mito, segundo o professor Tarcisio Bahia de Andrade. Segundo ele, a mesma condição também é encontrada em estados como o Rio de Janeiro e São Paulo.
“Isso, porém, também ocorre no Rio de Janeiro, cuja cidade possui praias maravilhosas (e muito famosas) e tem uma região serrana a 40 minutos de distância (Petrópolis, Teresópolis e arredores) que, além do clima, possui vários outros atrativos, inclusive históricos. Já o paulistano pode ir tanto para a região de Campos do Jordão ou para o litoral (Ubatuba) sem gastar tanto tempo”, explica.
Falta de planejamento e divulgação
“Quem não é visto, não é lembrado”, destaca Gustavo. O empresário chama atenção para as políticas de desenvolvimento e planejamento a longo prazo do setor de turismo no estado. O vice-presidente do Sindihotéis-ES destaca ainda a necessidade de realizar trabalhos promocionais e comerciais de forma mais efetiva e profissional para a divulgação das atrações turísticas.
O hoteleiro destaca o Nordeste como uma região que soube trabalhar e divulgar suas atrações. A Bahia é um exemplo, o estado possui diversos exemplos de turismo, desde aquele de menor volume, mas com maior gasto até o turismo de massa – como Salvador e Porto Seguro. “Eles são exemplos de modelo de trabalho, em ação de promoção e divulgação”, diz.
Guimarães ainda ressalta o fator do turismo interno. Para ele, essa circulação interna precisava de mais atenção. Ele exemplifica a campanha Capixabear, realizada pelo governo no primeiro semestre de 2022 – que possuía o objetivo de estimular o capixaba a descobrir as belezas do estado. Para ele a ação foi feita de forma tímida, sem prosseguimento ou ação feita pontualmente. “Para você vender um destino e transformá-lo em um lugar turístico, é necessário realizar uma ação prolongada”, evidencia.
Patrimônios históricos e preservação
Cercado de grandes potências turísticas com muitos atrativos, como o Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e Bahia, o Espírito Santo possui uma desvantagem diante deles quando se fala em bens históricos. Só os destinos de Rio, Minas e Bahia, possuem, cada um, cerca de 200 bens históricos tombados pelo Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Nesse quesito o território capixaba está em desvantagem, pois possui menos de 20, ou seja 10% de cada estado.
O professor Tarcisio Bahia de Andrade aponta ainda a degradação humana em Guarapari que refletem em problemas para os turistas. “Guarapari, que seria o principal destino em função da beleza da sua geografia, se tornou um lugar degradado pela ação humana, resultado de uma especulação imobiliária que fez a cidade se tornar sem graça, com problemas como engarrafamentos, praias poluídas, etc. Búzios, ao contrário, para usar como comparação, manteve uma baixa densidade urbana, com construções de 2 ou 3 pavimentos apenas, atraindo, portanto, um turista de maior renda”, aponta.
Mais treinamento e preparo
Praias movimentadas, outras mais calmas, hotéis “pé na areia”, hotéis de redes internais, pousadas mais imersas na natureza, gastronomia característica e, ao contrário do que dizem, atendimento de boa qualidade, são alguns dos potenciais destacados pelo vice-presidente do Sindihotéis-ES, Gustavo Guimarães.
Ao falar sobre o último tópico, Guimarães ainda destaque que, com mais treinamento e capacitação necessárias, o desenvolvimento da área iria “explodir”.
“O turismo é uma atividade econômica, ele gera emprego, renda e produz divisas para o próprio poder público poder reinvestir na população, como em contratação de mais funcionários e dessa forma circular o dinheiro”, ressalta.
O hoteleiro Gustavo frisa a necessidade de criar programas de formação continuada do turismo, ações coordenadas de promoção e comercialização da potencialidades do Espírito Santo.
Ele ainda defende uma parceria entre o setor privado e o setor público. “O poder público não pode fazer sozinho, pois realizar a área comercial não é seu perfil e a iniciativa privada não consegue alcançar sozinha essa amplitude, por uma questão de investimento e custo, mas possui toda essa capacidade de venda”, informa.
O empresário exemplifica os benefícios de possíveis uniões que poderiam ocorrer entre o governo estadual, com as administrações municipais das cidades com perfis turísticos e empresas como o Sebrae e entidades ligadas ao turismo, como o Sindicato e Associação de Hotéis, Sindicato de Bares e Restaurantes. “Por exemplo, a entidade ‘Visite o Espírito Santo’, o foco dela é fazer, exclusivamente, a promoção do destino turístico do estado. Eles irão realizar uma ação em um evento em São Paulo, totalmente custeado por eles e hotéis parceiros, sem participação do poder público”.
Especulação imobiliária em Guarapari
Assim como foi apontado pelo professor Tarcisio Bahia de Andrade, a construção desenfreada de prédios na cidade trouxe mais ônus que bônus para o local. O hoteleiro Gustavo Guimarães explica como isso afeta a cidade. “Cerca de 80% desse imóveis são vendidos para fora do estado, e passam a servir como investimento, segunda moradia ou casa de férias. E com o tempo as contas como IPTU, condomínio, água, luz vão chegando e com isso, o apartamento passa a ser para locação, como uma segunda renda. E o problema é que, como o proprietário e o locador são de fora do município, a transferência de valores passa por fora do estado”, esclarece.
Guimarães segue explicando que muitos desses turistas ainda trazem alimentos e bebidas de fora da cidade, e assim, consequentemente, a contribuição econômica desse turista para a economia daquele local passa a ser nula. E juntando a problemas como maior produção de esgoto, trânsito caótico, consumo de água muito acima do planejado, isso acaba gerando distúrbio para o município e quem paga é o morador, em impostos e taxas. Dessa forma, esse tipo de turismo passa a ser um decréscimo econômico.
Dessa maneira, o dinheiro – que deveria circular na cidade – acaba transitando para fora do estado. No entanto, esse problema não é exclusivo de Guarapari, também acontece em destinos como Anchieta, Piúma, Iriri, Aracruz, Marataízes, Itaúnas, Conceição da Barra. O hoteleiro ainda alerta que o mesmo está acontecendo nas montanhas, em regiões como Domingos Martins, Venda Nova, Marechal Floriano, nos condomínios lançados no locais.
“Será que não seria melhor que, ao invés de receber um milhão e meio de turistas, o número diminuísse para 500 mil, ou um terço dessa quantidade, mas que efetivamente gerasse resultado econômico para a cidade? O turismo é uma atividade econômica, e, portanto, ele deve gerar emprego, renda e divisas para o próprio poder público poder reinvestir na população local”, conclui.
