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Coluna João Gualberto

Coluna João Gualberto: Construir o futuro

Todos os sistemas nascem, crescem e morrem. Esse ciclo não será para sempre

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Palácio Anchieta. Foto: Carlos Macapuna

O Espírito Santo tem Capital Político. Todas as vezes que foi necessário, fomos capazes de resolver grandes impasses políticos. Muito expressivo foi o apoio ao governo Christiano Dias Lopes, iniciado em 1967, dado pela nossa Federação das Indústrias, presidida por Américo Buaiz, o seu criador. A FINDES elaborou os estudos e construiu todo o projeto do governo que se iniciava. O governo Christiano foi um momento importante na construção do Espírito Santo Moderno, cuja ação em prol do desenvolvimento, incluindo suas iniciativas, por exemplo, na articulação nacional pela construção das BR’s 101 e 262, que tiraram nosso estado do isolamento nacional. Houve, de fato, naquele momento um consenso das necessidades em nosso estado. Começamos a superar a tragédia social da erradicação de nossos cafezais, onde, até então, toda a economia capixaba estivera contida na cadeia produtiva do café. Nosso empresariado mostrou seu papel na construção da sociedade.

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Outro momento crucial foi no início dos anos 2.000, quando precisávamos vencer o quadro de corrupção endêmica que estava instalada. Diante da crise, mais uma vez os empresários estiveram presentes e foi criada uma nova instituição, o Movimento Empresarial Espírito Santo em Ação. A instituição deu suporte a ciclo de bons governos com ações em vários campos. Na verdade, muito colaborou no alinhamento institucional e na política de bons resultados em muitos setores da sociedade. Mas não foi apenas o ES em Ação, nosso capital político esteve presente na construção do Fórum Reage Espírito Santo articulado pela OAB-ES, que chegou a pedir intervenção federal no estado.

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Creio que nos acostumamos com esses governos responsáveis que os capixabas ajudaram as suas lideranças políticas a construir, em especial aos dois governadores desse ciclo: Paulo Hartung e Renato Casagrande. Mas todos os sistemas nascem, crescem e morrem. Esse ciclo não será para sempre. Importante pensar como devemos nos organizar para dar sustentabilidade a um modelo político que interessa a todos e que se mantenha.

Temos assim um desafio novo: nunca mais deixar a desorganização tomar conta do estado, como aconteceu nos anos 1960, pela crise café ou nos anos 2.000, devido à crise ética. Organizar leva anos, desorganizar leva apenas meses. Esse é o nosso panorama político como manter as instituições alinhadas. Digo isso, porque o momento político e social tem muitas diferenças em relação a duas décadas atrás. Talvez seja preciso uma nova ousadia.

A principal diferença se instituiu pela digitalização. Estamos vivendo em um mundo onde o poder está muito fragmentado. As grandes plantas industriais levaram suas instâncias decisórias para os grandes centros como São Paulo, e mesmo as políticas de relacionamento com as bases locais, com as comunidades, sofreram um certo esvaziamento, especialmente depois da pandemia.
Importante lembrar que a renovação geracional que se faz, por exemplo, no mundo rural está fortemente ligada à internet. Redes sociais como o Instagram são, agora, o lugar das decisões de compra e de venda de muitos produtos e serviços. Esse novo mundo não tem mais centros locais. As novas gerações de empreendedores têm uma outra lógica política, mais a direita, em sua maioria e muito pouco ligada a territórios e instituições. Os negócios, mesmo pequenos, foram nacionalizados ou mesmo internacionalizados.

De uma forma geral, os ideais conservadores tomaram conta da nossa sociedade. Esse é um outro fator. O alinhamento das pessoas agora se dá por grandes temas nacionais, como aconteceu por exemplo com as eleições para os conselhos tutelares e o alinhamento pró-Israel ou não, na guerra que se inicia e aprofunda em Gaza. Tudo se politiza no quadro da polarização direita e esquerda. É um outro diálogo.

Nosso desafio, creio, é uma nova interlocução empresarial e social dentro desse novo quadro. Precisamos trazer esse novo mundo para a interlocução, ou a fragmentação da dinâmica econômica produzirá uma desarticulação enorme. Creio que o caminho está na construção de um novo desenho de formação de lideranças para o diálogo democrático e que garantam renovar o nosso capital político.

Dou um exemplo: somos, hoje, um dos estados mais evangélicos do Brasil, se não formos o maior. A maioria desses evangélicos é neopentecostal. Gente, em sua maioria, definida com 3 pês: pobre, periférica e preta, é, também, um mundo vastamente feminino. Suas lideranças estão fragmentadas em muitas igrejas, mas unidas por princípios que advêm de valores familiares conservadores, pela busca da prosperidade e por uma certa negação do assistencialismo. É preciso uma articulação por princípios.

Vou lembrar o próprio ES em Ação já tem uma semente do que estou falando, o projeto Líderes do Amanhã. Ele forma lideranças empresarias saídas da classe média alta ou dos filhos de empresários. Movimento muito importante, mas também é fundamental abrir um diálogo com lideranças de outros segmentos como os que renovam a agricultura, empreendem através de startups ou constroem coletivos urbanos que conversam com a juventude de todas as classes sociais, além dos evangélicos. Para uma sociedade em transformação, um novo modelo de construção de lideranças e um novo formato de construção do capital político.


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João Gualberto

João Gualberto é professor Emérito da Universidade Federal do Espírito Santo e Pós-Doutor em Gestão e Cultura (UFBA). Também foi Secretário de Cultura do Espírito Santo de 2014 a 2018. João Gualberto nasceu em Cachoeiro do Itapemirim e mora em Vitória, no Espírito Santo. Como pesquisador e professor, o trabalho diário de João é a análise do “Caso Brasileiro”. Principalmente do ponto de vista da cultura, da antropologia e da política.

Os artigos publicados pelos colunistas são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam as ideias ou opiniões do ES360.