Coluna João Gualberto
Coluna João Gualberto | Reinvenção Coletiva
Na sociedade brasileira os indígenas, os povos originários, são um grande exemplo dessa reinvenção
Escrevi anteriormente o artigo que chamei de Reinventar-se, publicado aqui mesmo neste espaço. Nele chamei a atenção para, a partir da observação da obra do sociólogo inglês Anthony Giddens, valorizarmos o tempo em que vivemos, afinal nele podemos, pela primeira vez na história da humanidade, planejar nossa própria existência e realizar mudanças em nós mesmos, para alcançar nossos desejos, como nunca antes foi visto. Mudamos de cidade, de país, a cor dos cabelos, as feições e mesmo assumimos nosso gênero, independentemente do sexo biológico. É claro que em determinados países a condição feminina ainda é muito dura para as mulheres, existe forte preconceito com os homossexuais, com as pessoas transgênero e ainda muitos outros elementos que restringem as liberdades individuais, mas os avanços são sensíveis em quase todo o mundo.
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Neste texto quero explorar um outro aspecto da alta modernidade, como a definiu também Giddens: a construção de novos atores coletivos. Por meio desse movimento passou a ser possível a muitos de nós mostrar-nos mais como somos verdadeiramente, e não como sempre aconteceu no mundo antigo. É só pensarmos na rigidez de uma aldeia medieval para materializarmos o que quero dizer.
Os atores coletivos contemporâneos a que me refiro são, diferentemente dos indivíduos, grupos sociais até então marginalizados ou tidos mesmo com inferiores pelas forças dominantes. Ao serem discriminadas, até mesmo por meios legais, as pessoas que compunham esses grupos tiveram suas existências massacradas.
Na sociedade brasileira os indígenas, os povos originários, são um grande exemplo disso. Colonizados, catequisados de forma obrigatória, perderam toda a potência de sua cultura. Darcy Ribeiro em muitos de seus estudos mostra isso claramente. Um povo do qual retiraram a língua, seus costumes, sua cultura, indivíduos que se viram depois transformados no contingente dos mais pobres nos centros urbanos. Mais recentemente começamos a reconhecer toda a sua força e sua ancestralidade. É ainda um processo, temos ainda resistências, mas não resta dúvida de que há também um movimento que nasce desse povo injustiçado e tem adesões sociais importantes para reconhecer sua força, sua potência. Um ator coletivo que a nossa história massacrou e que agora vai ganhando novo espaço social.
Os movimentos sociais protagonizados por aqueles que são descendentes de ex escravizados e que buscam reagir aos preconceitos enraizados em nosso meio social tem crescido em número e conseguido muitas conquistas importantes. O racismo é um dos maiores males de nossas sociedades, mas ele tem sido combatido por muitos, e os movimentos antirracistas têm obtido suas vitórias. Quero, entretanto, me fixar em um ponto: não há dúvida de que esse novo ator social está surgindo no Brasil desde as últimas décadas e protagoniza lutas por direitos e também por reconhecimento social. Quando imaginamos o Brasil dos anos 1950, por exemplo, e o comparamos ao que vemos hoje, não há dúvida de que esse grupo social importante se constituiu em meio a uma sociedade injusta, preconceituosa e desigual. Tudo se deve a seu próprio esforço por superação da situação que nossas elites dominantes criaram.
Por fim há um outro grupo social, diferente dos dois já citados, mas que também encontrou um novo lugar no mundo, os chamados idosos, terceira idade, os mais velhos, enfim. Antes destinados ao silêncio dos lares e ao convívio restrito dos familiares, agora eles têm a seu favor o incrível avanço da medicina, que aliviou os sintomas de doenças, descobriu novos medicamentos que ampliaram enormemente a expectativa de vida e cirurgias quase milagrosas, se compararmos ao que era vivido há um século. O papel social da população idosa, entretanto, precisa ser melhor pensado. A experiência deve ser aliada ao empreendedorismo jovem para alcançar bons resultados em nossos dias.
A autoridade que vinha com a experiência perdeu seu valor em nossos dias. As cabeças brancas, agora, têm que mostrar flexibilidade e capacidade de interagir com outros grupos sem imaginar que sua experiência possa resolver, por si só, problemas que são novos e que exigem novos processos, novas formas de comunicação. Talvez esse grupo deva se retirar da ação e caminhar mais para o nível dos aconselhamentos. Viver mais exige novas posturas, mas não há dúvida de que existe um novo sentido para a idade e mesmo esses novos atores sociais no mundo.
Enfim, diversos atores coletivos saíram das sombras e vieram viver suas vidas com mais autonomia, alegria e liberdade entre todos. Um dia faremos deste Brasil um lugar de convívio mais fraterno entre grupos sociais tão diversos e ao mesmo tempo tão complementares entre si.
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